Thursday, November 30, 2006

Nos acréscimos

Era uma tarde chuvosa de terça-feira. Teria tudo para ser um diazinho mahomenos, mas era um daqueles dias em que você chega no seu trabalho com um cérebro e sai de lá com um caroço de azeitona no lugar.

Entre e-mails e contatos telefônicos com clientes internos e fornecedores externos, toca o celular. Olhos fixos na tela do micro, celular no ouvido e um "Alô". Do outro lado, a resposta que ninguém quer ouvir num momento turbulento como esse:

- Alô. Boa tarde. É o senhor Leonardo?!

[O mau dos serviços de telemarketing é a total falta de critério para fazer as malditas ligações. Vejam bem, terça-feira, 15h, O que faz vagabundo pensar que um sujeito economicamente produtivo tem tempo para receber ligações que se dedicam a compelí-lo a gastar dinheiro com serviços totalmente dispensáveis? Outro horário que essa mulherada adora ligar é as 9h da manhã de sábado!!!! Porra! Confesso que estive prestes a sugerir ao Governo do Estado do Rio de Janeiro a criação de uma divisão BOPE especializada prevenir crimes contra o sono e em exterminar operadoras de telemarketing!]

- Aqui é Fulana do Banco Scranckers. O senhor pode falar agora ou está ocupado?
- Estou ocupado. Estou no meio do meu expediente.
- Ah sim... Então, estamos ligando para...

[Ué?! Mas eu não disse que estava ocupado? Não fez a menor diferença!!!! Se eu tivesse respondido "Banana" ela diria exatamente a mesma coisa.]

Bom... nos 10 minutos que se seguiram, ela procurou, em linhas gerais, me apresentar as vantagens que o meu novo cartão de crédito, fruto de um upgrade automático, me ofereceria. Do lado de cá, com o telefone apoiado entre a orelha e o ombro direitos, me dedicava a responder no a-hãnês, enquanto fazia meu trabalho.

O novo cartão me permitiria o ingresso num programa de bônus - daqueles que você gasta, gasta, gasta e gasta e troca seus 2.970.650 pontos por um daqueles pacotes de amendoin que você come de grátis em qualquer vôo Gol e ainda reclama - e me traria uma série de benefícios que "o senhor não pode perder, não é, senhor Leonardo?" - a-hã.

- Senhor Leonardo, o senhor aceita o cartão?
- A-hã.
- Então aguarde alguns instantes até que nosso supervisor venha pessoalmente conversar com o senhor.

Loading... Muitos minutos se passaram até que eu desliguei a porra do telefone. Essa coisa de apoiar o telefone no ombro estava me rendendo o apelido de Frei Damião. Não demorou e ela me ligou novamente.

- Senhor Leonardo, é a Fulana do Banco Scranckes, tudo bem? Acho que caiu a ligação, não é?
- Não. Eu desliguei porque preciso trabalhar. Não posso falar agora. Me liga depois.
- Não... peraí, rapidinho [momento “descendo do salto alto”]. O supervisor já vem.
- Passar bem.
- Não! FULANO!! ANDA LOGO, QUE EU TO PERDENDO O HOMI!!!!

[??????????????????????????????????????????? O homi?! E o Prêmio Luiz Paretto de perdeção de linha em ambiente telefônico na categoria telemarketing ativo vai para...]

Esbaforido, o jovem supervisor chega ao telefone e confirma meus dados de recebimento, como de praxe. De â-hã em a-hã, a gente ia indo, para tornar a coisa mais ágil. Terminadas as confirmações, volta a ligação para a jovem:

- Então é isso, senhor Leonardo. Confirmados os dados, agora só me resta o senhor confirmar a aquisição do serviço. Vou ler e no final, o senhor me confirma, ok? O senhor está tendo o prazer de adquirir em sua residência dois cartões de crédito Scranckers, dentro do programa Super Scranckers de Bônus. Um para o senhor e um para a sua esposa...

- AAAAAAAALOW!!!!!! PODE PARAR AÍ MESMO!!! Tu ta querendo me fazer perder dinheiro?! Bebeu?!

Finalmente ela conseguiu a minha atenção. Gente, essa pessoa acabou de dar uma aula de como desperdiçar uma oportunidade de negócio no último instante possível. É como participar do Programa Silvio Santos, ser chamado por ele para aquela brincadeira do PIN, contar certinho até o 39, estar com o automóvel zerinho nas suas mãos e dizer QUARENTA, ao invés do PIN!

Bom, eu gritei tanto com a mulher, que consegui, pela primeira vez na história, fazer um operador de telemarketing bater o telefone na minha cara.

Confesso que me orgulho disso até hoje.

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