Thursday, November 30, 2006

Nos acréscimos

Era uma tarde chuvosa de terça-feira. Teria tudo para ser um diazinho mahomenos, mas era um daqueles dias em que você chega no seu trabalho com um cérebro e sai de lá com um caroço de azeitona no lugar.

Entre e-mails e contatos telefônicos com clientes internos e fornecedores externos, toca o celular. Olhos fixos na tela do micro, celular no ouvido e um "Alô". Do outro lado, a resposta que ninguém quer ouvir num momento turbulento como esse:

- Alô. Boa tarde. É o senhor Leonardo?!

[O mau dos serviços de telemarketing é a total falta de critério para fazer as malditas ligações. Vejam bem, terça-feira, 15h, O que faz vagabundo pensar que um sujeito economicamente produtivo tem tempo para receber ligações que se dedicam a compelí-lo a gastar dinheiro com serviços totalmente dispensáveis? Outro horário que essa mulherada adora ligar é as 9h da manhã de sábado!!!! Porra! Confesso que estive prestes a sugerir ao Governo do Estado do Rio de Janeiro a criação de uma divisão BOPE especializada prevenir crimes contra o sono e em exterminar operadoras de telemarketing!]

- Aqui é Fulana do Banco Scranckers. O senhor pode falar agora ou está ocupado?
- Estou ocupado. Estou no meio do meu expediente.
- Ah sim... Então, estamos ligando para...

[Ué?! Mas eu não disse que estava ocupado? Não fez a menor diferença!!!! Se eu tivesse respondido "Banana" ela diria exatamente a mesma coisa.]

Bom... nos 10 minutos que se seguiram, ela procurou, em linhas gerais, me apresentar as vantagens que o meu novo cartão de crédito, fruto de um upgrade automático, me ofereceria. Do lado de cá, com o telefone apoiado entre a orelha e o ombro direitos, me dedicava a responder no a-hãnês, enquanto fazia meu trabalho.

O novo cartão me permitiria o ingresso num programa de bônus - daqueles que você gasta, gasta, gasta e gasta e troca seus 2.970.650 pontos por um daqueles pacotes de amendoin que você come de grátis em qualquer vôo Gol e ainda reclama - e me traria uma série de benefícios que "o senhor não pode perder, não é, senhor Leonardo?" - a-hã.

- Senhor Leonardo, o senhor aceita o cartão?
- A-hã.
- Então aguarde alguns instantes até que nosso supervisor venha pessoalmente conversar com o senhor.

Loading... Muitos minutos se passaram até que eu desliguei a porra do telefone. Essa coisa de apoiar o telefone no ombro estava me rendendo o apelido de Frei Damião. Não demorou e ela me ligou novamente.

- Senhor Leonardo, é a Fulana do Banco Scranckes, tudo bem? Acho que caiu a ligação, não é?
- Não. Eu desliguei porque preciso trabalhar. Não posso falar agora. Me liga depois.
- Não... peraí, rapidinho [momento “descendo do salto alto”]. O supervisor já vem.
- Passar bem.
- Não! FULANO!! ANDA LOGO, QUE EU TO PERDENDO O HOMI!!!!

[??????????????????????????????????????????? O homi?! E o Prêmio Luiz Paretto de perdeção de linha em ambiente telefônico na categoria telemarketing ativo vai para...]

Esbaforido, o jovem supervisor chega ao telefone e confirma meus dados de recebimento, como de praxe. De â-hã em a-hã, a gente ia indo, para tornar a coisa mais ágil. Terminadas as confirmações, volta a ligação para a jovem:

- Então é isso, senhor Leonardo. Confirmados os dados, agora só me resta o senhor confirmar a aquisição do serviço. Vou ler e no final, o senhor me confirma, ok? O senhor está tendo o prazer de adquirir em sua residência dois cartões de crédito Scranckers, dentro do programa Super Scranckers de Bônus. Um para o senhor e um para a sua esposa...

- AAAAAAAALOW!!!!!! PODE PARAR AÍ MESMO!!! Tu ta querendo me fazer perder dinheiro?! Bebeu?!

Finalmente ela conseguiu a minha atenção. Gente, essa pessoa acabou de dar uma aula de como desperdiçar uma oportunidade de negócio no último instante possível. É como participar do Programa Silvio Santos, ser chamado por ele para aquela brincadeira do PIN, contar certinho até o 39, estar com o automóvel zerinho nas suas mãos e dizer QUARENTA, ao invés do PIN!

Bom, eu gritei tanto com a mulher, que consegui, pela primeira vez na história, fazer um operador de telemarketing bater o telefone na minha cara.

Confesso que me orgulho disso até hoje.

Wednesday, November 29, 2006

Não saia com ele

Um grupo de mulheres está causando uma revolução no universo masculino com a criação do site “Não saia com ele” (http://naosaiacomele.com). A página é um tipo de lista negra de tipos não-recomendáveis a um relacionamento decente e maduro. Entre os denunciados estão conquistadores que não ligam no dia seguinte, ciumentos patológicos, traidores seriais e mesmo rapazes que, até então, estavam escondidos no armário.

Obviamente, o objetivo é atingir o mundo das cuecas mortalmente, mas dificilmente isso vai acontecer. O tal site é uma mera reprodução do comportamento que guia a espécie há milênios. Nenhum cara liga pra sua suposta capacidade de ser um canalha. Tanto que conta para meio mundo seu escore entre quatro paredes e suas falcatruas. O incrível é que agora as mulheres começam a corroborar essa mesma pontuação. E os cestinhas vão cada vez contando mais vantagens.

Por trás de toda essa suposta indignação está o mito que fascina boa parte das mulheres: o do macho dominante, aquele por quem todas as fêmeas do grupo caem de amores. Ele pode ser o maior safado que já habitou a terra, mas enquanto está com ela é o homem dos sonhos. E não interessa que este tempo costume durar, segundo estudos científicos, em média 47,89 minutos.

Enquanto isso, os caras que mandam rosas, fazem canções apaixonadas e dizem “eu te amo” olhando no olho, visitam o tal site nas noites solitárias de sábado e se perguntam o que está errado. No momento em que decidem tunar seu carro, ouvir Latino a todo volume, agarrar tudo que use calcinhas ou tomar umas bombas para ficar mais sarado, algo acontece. As criadoras do site atingem em parte seu objetivo: acabam com mais um homem. Mas não um pertencente às linhas inimigas e sim um dos poucos que poderia gostar de verdade delas.

Saturday, November 25, 2006

Fetiche do Loirão

Trago da infância o medo da Cuca, da bruxa de verruga no nariz e da minha versão para aquela música “era uma casa muito engraçada...”, que para mim se localizava na Rua dos Lobos, um lugar sombrio de minha imaginação. Hoje, no entanto, um novo personagem passou a habitar meus pesadelos, e nem sei ao certo o que a respeito dele me assusta.

Por cerca de dois meses saí com um cara – um cara “com referência”, como uma amiga costuma falar. Logo de início soube que ele estava de mudança marcada para a Europa, mas resolvi deixar a vida me levar. É claro que a dita cuja me levou diretamente para o tal rapaz. Saímos várias vezes até que, quando percebi, já conhecíamos família, casa, amigos, falávamos por telefone como antibiótico, três vezes ao dia, e o assunto da viagem para a terra de Bono Vox nunca era tema de conversa.

No meio desse – na falta de outra palavra, vá lá – namoro, cheguei a pensar em indagar o rapaz sobre seus planos de tornar-se pastor de ovelhas ou terrorista católico em uma ilha fria, mas adiei. Semanas se passaram, até que nos vemos numa sexta-feira, juntos, na Casa da Matriz. Nós, nossos amigos, um programa normal. Num dado momento, ele anunciou que iria ao segundo andar com seu amigo. Nada mais normal, eu havia acabado de borboletear com minha companheira. Por coincidência, resolvemos subir logo depois. Ao chegarmos à outra pista de dança, deparamo-nos com ele aos beijos com uma mulher loira - não que, até então, isso fizesse alguma diferença.

Em direção à saída, atordoada com o que tinha visto, resolvi voltar e dar-lhe o crédito da dúvida. Dirigi-me a ele – a essa altura, já sentado com o braço ao redor de sua nova conquista – e, incrédula, perguntei: “você está ficando com ela?”. Ao que, sem se mexer, respondeu que sim. Nunca saí tão rapidamente de um lugar.

Nessa história toda, foi a reação do tal rapaz o que mais me intrigou, parecia tomado por uma inércia estranha. Não se importou em dar satisfação, desculpar-se. Chegou a me procurar, insistentemente, com telefonemas, flores e pedidos de outra chance, mas não tinha noção real da bizarrice de seu feito. Para ele – acho – era inevitável, praticamente uma obrigação, render-se ao ataque na pista escura. Afinal, ele é jovem, estava de viagem marcada, despedia-se do Rio com toda uma vida pela frente, devia mais é aproveitar o momento... Ou, como resumiu de maneira mesmo ingênua à minha amiga e defensora, “foi o fetiche do Loirão”.

Muito bem, que um ser humano tenha preferência por pessoas com cabelo de cor clara, eu posso compreender. Até sua falta de educação e de respeito não me incomodaram tanto. O que realmente me fez perder o sono foi a sensação de que tudo aquilo era normal. Tempo depois, acusou-me de parecer não me importar com sua partida. Então, fui eu a culpada, seja por ter sido muito confiante ou apenas conformada. Fato é que, entre a mulher neurótica e a segura que eu poderia ter sido – e, acreditem, podemos ser as duas facilmente – ele ficou com o “fetiche”. De feitiço, objeto inanimado ou parte do corpo a que se atribui poder sobrenatural. Não há dúvida, “enfeitiçado” o sujeito não é responsável por suas ações. A escolha de tal palavra parece dizer mais de um momento do que de uma pessoa apenas, e essa apatia me assusta ainda mais do que o próprio “Loirão”. Para isso, não há tinta colorante que dê jeito.

Friday, November 24, 2006

O chifre virou problema de Estado (e Santo Antônio casa e levanta a auto-estima)

O que chamou atenção esta semana não foi a anoréxica cobertura que a mídia realizou da morte da modelo-saco-de-osso Ana não-sei-das-quantas. (Ela ficou até mais famosa do que era antes. Se ressuscitasse, seria em grande estilo. Afinal, não é qualquer defunto que aparece na imprensa com um modelito assinado por Giorgio Armani. Até Jesus só apareceu enrolado num pedaço de pano).

O destaque desta semana vai para a Câmara Municipal de Novo Santo Antônio, interior do Mato Grosso. Em março, eles aprovaram uma lei que manda a prefeitura distribuir estimulantes sexuais para homens com mais de 60 anos. Chegamos, finalmente, no extremo das políticas públicas. Desde o Bráulio do governo federal, é a melhor iniciativa de política pública que esse país já viu no ramo da sexualidade.

O assunto veio à tona esta semana por causa de uma mudança que as esposas dos velhinhos querem fazer na lei. Ao invés deles, elas querem ter o direito de buscar os remedinhos. Isso porque os vovôs estão retirando o brinquedo e levando as raparigas mais novas para passear no parque. Safadeza não tem idade. E daí chifre vira problema de Estado. Se virar moda, daí eu quero ver a justiça funcionar. É por isso que os magistrados querem aumento. Além de consolo judicial, tem que dar um jeito de arranjar consolo sexual (de terceira idade).

Coitada das velhinhas. Elas não merecem. Por isso, lanço aqui uma campanha a favor delas. Sugiro que o Dráuzio Varella, nosso amigo do Fantástico e que agora só fala do pessoal de idade avançada, lance uma sessão cupido no quadro dele. Já pensou: Velhinhas trocadas pelo Viagra querem ter acesso. Inclusão social! Ninguém quer fazer isso com elas! É sempre a galera da terceira idade que se ferra.

Porque não, uma reforma na previdência. Todas as velhinhas do Brasil deveriam ter o direito de resgatar o fundo. Cartão do Bom Cidadão: passa o cartão e tira o fundo. As velhinhas vão sair do fundo.

Por obsequio: olha aqui. Fez efeito até nos USA.

Thursday, November 23, 2006

O paradoxo da não adaptação

Vou lhe fazer uma pergunta e peço que você responda – mas responda mentalmente, caso contrário neguinho pode te mandar para um hospício por falar com um computador: quando você era criança, te contaram a história da formiga e da cigarra?

Eu sei... a resposta é sim. Essa é mais uma daquelas histórias doutrinantes, que buscam moldar as crianças dentro de um comportamento padronizado. Ao contrário do que normalmente se interpreta, o princípio de que o trabalho dignifica o homem não é o centro da moral. A questão toda está representada na figura da formiga e sua dedicação mecanicista no sentido de manter a ordem e a estrutura sobre a qual está montado todo o sistema de abastecimento de sua comunidade e que, por conseqüência, condiciona a sobrevivência de todos por lá. Ou seja, a moral é: ou você se enquadra ou, cedo ou tarde, vai acabar se fudendo.

Mas como impingir as regras de comportamento de uma formiga à realidade de uma cigarra? Essa é a questão que fica. De fato, a não-adaptação é um lance meio complicado e, normalmente, vagabundo sofre conseqüências por viver, ou melhor, ser compelido pela sua a essência/história a viver segundo outras regras. Mas qual é o mal disso, se ele está preparado e disposto a pagar o preço?

Contada sob o olhar da cigarra, a história toma contornos diferentes. Ao contrário da formiga, que vive segundo os desígnios do dever, a cigarra vive segundo o existir, o experimentar, o viver em si. Para ela, os mecanicismos do mundo funcional não funcionam e toda sua inquietação se encarrega da re-significação do mundo de normalidades cegas, segundo o seu olhar, sua sensibilidade. O mundo, que na mão da formiga se torna função, fazendo melhor a vida de todos – inclusive a da cigarra – na mão da cigarra, vira poesia.

Ela não queria se adaptar, aceitar cegamente aquilo que as regras estabelecidas a impunha porque deixaria de lado a essência do que ela era. Experimentou o que quis, no momento em que quis. Praticou o sexo, drogas e rock and roll com pulgas e percevejos – para quem compôs canções únicas, que Gilliard, evidentemente, interpretou como barulho digno de Baygon – viveu intensamente da caridade de quem a detestava, buscando todo amor que houvesse nessa vida. Morreu tão intensamente quanto viveu, nos acúmulos de seus erros e acertos, os quais estarão sujeitos ao julgamento de todos, mas e daí?

O resultado disso, sustentado numa sensibilidade única de uma vida louca vida, foram canções que ainda hoje embalam e geram significação para jovens formigas que vivem a idade da inconseqüência, da irresponsabilidade e que praticam o Rebel Yell.

Vida boa ou ruim eu não sei e não me sinto capaz de julgar. Somente bato palmas para as formigas que enxergaram além dos excessos e das idéias pré-concebidas sobre as cigarras e para as cigarras que vêem nas formigas e suas obras muito mais do que simples exemplos de uma vida mal conduzida, segundo a burocracia mecanicista.

Tuesday, November 14, 2006

Quarenta quilos

Quarenta quilos distribuídos em um metro e 74 centímetros de altura. Este era o ideal de beleza de Ana Carolina Reston, de 21 anos, morta nesta terça-feira por inanição. Sim, você leu certo, a modelo paulista morreu de fome. Há poucos dias, Carol ainda desfilava sua beleza quase fúnebre pelas passarelas do mundo inteiro. Países como China, Turquia e Japão, por exemplo, eram o palco de seus elegantes passos. No entanto, apesar das andanças internacionais de Ana Carolina, o Brasil foi o altar onde o mundo da moda a imolou como um aviso das exigências para a temporada 2007.

O Brasil é uma potência na exportação de beleza, a maioria das top-models da atualidade é daqui. A profissão começa cedo, é comum meninas de 13 ou até 12 anos já desfilando e aprendendo a fechar a boca para se enquadrar nos rigorosos parâmetros do meio. O que começa com dietas malucas acaba se tornando uma negação permanente em se deliciar com qualquer alimento que seja. A partir de certo ponto, a pessoa passa a sentir aversão à comida, inclusive, vomitando o pouco que consegue consumir.

Ana Carolina se achava feia pelas supostas gordurinhas que teria a mais. A questão não é se havia gordurinhas a mais, nem se a modelo sofria de algum distúrbio (com certeza, sofria). Muita gente vai dizer (sem qualquer senso de sensibilidade) que faltaram umas boas palmadas. Tolice. Realmente falta disciplinar nossas crianças, mas não só elas.

É hora de ensinar e aprender o significado da fome, nem que seja de maneira infantil e simplória. Passar fome é feio, é horrível. Morrer de fome é inaceitável, é desumano. Talvez assim a feiúra da fome, presente nos traços de um rosto perfeito no outdoor da esquina ou no braço esquelético do menino de rua que nos pede um trocado na mesma esquina, deixará de ser algo normal e até belo para os brasileiros.

Thursday, November 09, 2006

A superficialidade da gostosura

Outro dia, estávamos eu e minha mulher no carro, voltando das compras e papeando trivialidades. Cena típica do jovem casal de classe média, sem filhos e com muito por construir e tal. A coisa transcorria dentro de uma certa normalidade quando, não mais do que de repente, ela vira-se pra mim e me pergunta: “Amore, o que é uma mulher gostosa?!”

A nossa sorte é que ela vinha dirigindo. Se eu estou no volante, não precisava nem ter carro por perto que eu acabaria encontrando alguma coisa para bater, tal foi o grau de atordoamento que me tomou naquele instante. É aquela coisa “Pô... legal essa música”, “semana que vem vence o aluguel”, “ih... ta com cara de que vem chuva”, “o que é uma mulher gostosa?”. Tum! Silêncio... olhos esbugalhados, boca seca e um hesitoso: Hein?!

O interessante é que na mesma semana, no trabalho, o mesmo tema veio à tona, mas de outro jeito. “Vocês acham fulana gostosa?! Mas ela é tão bagaceira!!!”, “Beltrana também?! Pô... mas aquilo é de silicone!!”, “Pô... fala sério que vocês acham Aquelazinha gostosa! Ela é mulher de pagodeiro-traficante!”

Meninas, quando um sujeito diz que uma mulher é gostosa não leva em conta antecedentes criminais, o número de cirurgias pelas quais ela passou, tampouco sua bagagem cultural e bons modos. Ninguém faz uma análise antropo-psico-sócio-cultural, baseada em Baudrillard e Morin, para definir esse tipo de coisa. O conceito de mulher gostosa é tão raso quanto um peitinho antes da turbinada, tão superficial quanto tudo o que vocês vêem nessas mulheres aí e até por isso confere. A profundidade é analisada sob um prisma muito mais mundano, por assim dizer. Gostosura um conceito puramente estético e funcional, formas e estruturas. A mulher gostosa é sinuosa, tem curvas e tem sustância. Coxas grossas, peitos firmes, bunda carnuda e em pé, muito ziriguidum e bucomufo no catelefôfo. E é isso.

Num segundo nível, características como personalidade, auto-confiança, presença e sorriso ordinário (quanto mais, melhor) potencializam ainda mais o quadro, mas são totalmente dispensáveis numa avaliação inicial. A beleza ajuda muito na diferenciação e no estabelecimento de graus de atratibilidade, mas também não é pré-requisito básico. Isso, é claro, para poder te definir alguma coisa, porque normalmente tudo o que o cara precisa para classificar uma mulher como gostosa é o instinto. Bate o olho e diz: mmm... mas é gostosa!

Fica muito mais fácil de entender se a gente pensar no conceito real da palavra "gostosa". Levando pro lado gastronômico, uma comida gostosa é aquela que tem bom sabor e pronto. O problema é que mulher se preocupa demais com teor calórico, níveis de açúcar, valor nutricional e demais "feminilismos" que se perdem naquilo que deveria ser tão básico. Mulher não reconhece o conceito de "gostosa", porque só enxerga a "gostosura trans".

Dei essa explicação para a patroa e, para minha surpresa, ela passou o resto do trajeto me apontando mulheres gostosas para ver se conferia. Passou no teste com louvor. Está preparada para comentar a mulherada comigo na rua. Isso é o que eu chamo de relacionamento maduro.

Complicado vai ser se ela começar a virar a cabeça para manjar a bunda das mulheres que vêm na contra-mão. Pra isso, definitivamente, eu não estou preparado.

Tuesday, November 07, 2006

Tudo ou nada

Em reportagem da semana passada, a revista Veja declarou a morte do rock. Claro que isso é dito há algumas décadas, a cada vez que alguma modinha musical ganha algum destaque.

Mas sou obrigado a concordar. Após ter heróis da estirpe de Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jonh Lennon correndo em suas veias, o rock foi envenenado pela multiplicidade de organismos estranhos em sua corrente sanguínea. Toda tralha sonora é chamada de rock nesses dias carentes de harmonia e repletos de barulho.

Rock não pode jamais ser tudo, como muitos costumam acreditar. Suas bases foram construídas sobre o nada. Quando nada mais restava, quando a família não dava a mínima, quando a humilhação era rotina na escola ou quando nenhuma mulher notava sua existência, um garoto maluco juntava um bando de infelizes e descarregava sua frustração em canções geniais.

O coração vazio de cada um daqueles doidos se tranformava na caixa onde ressonavam melodias vigorosas, com letras que falavam o que não podia ser dito. E nós éramos abançoados. Nada era melhor do que se encerrar no quarto e ouvir aquele nada em estado bruto encher nosso espírito, fazendo nosso traseiro deixar a cama e viver ao estilo mais rock'n'roll que poderia haver.

As coisas agora são mais simples, a rebeldia não é mais exclusividade dos astros. Qualquer guri ou guria se expressa com rebeldia, já começando pelo desafio aos próprios olhos, sempre tapados pela cabeleira lambida que cobre quase a cara toda. As marcas dessa geração são feitas na pele, já que deixar marcas na vida é algo fora de cogitação. A profundidade de pensamento e os questionamentos dizem respeito apenas à escolha da roupa mais provocante, do celular mais entupido de funções ou do barzinho mais "in" da cidade.

Acompanhando essa rebeldia com código de barras, as bandas vão e vêm, preservando o ar derrotista que sopra desde o último suspiro de Kurt Cobain. Recentemente, pra piorar, o tal Emo se manifestou como uma praga, mas o veneno contra ele foi absorvido pelas gravadoras e pelos adolescentes cada vez mais bundões de hoje.

Pensar no que o rock significou um dia para mim não faz mais qualquer sentido, me rendi ao novo rock. Na era em que o rock é tudo, ou tudo é rock, tudo que o rock de hoje faz é me manter assim, sem fazer nada. Não poderia haver atestado de óbito maior.

Thursday, November 02, 2006

Evoluindo?

Eu queria ter vivido as décadas de 60 e 70, mas quando me dei conta de que tinha pernas e de que babar em mim mesmo era vergonhoso já estávamos nos anos 80 - a última grande década até agora. Se você é daqueles que discorda de mim e chama a década de 80 de anos perdidos, foda-se. Eu não pedi a sua opinião, pedi? Aliás... quer pergunta mais sessentista do que essa última?

Aquelas foram as duas últimas décadas românticas da história da humanidade. O clima de tensão latente na geo-política internacional foi responsável por um cenário sócio-cultural interessantíssimo e muito variado.

Os Stones surgiram como reflexo de uma juventude que finalmente começava a buscar a sua liberdade e a se explorar, enquanto questionava os dogmas estabelecidos pela moralidade. Os movimentos negros dos EUA, além dos discursos de Martin Luther King, nos deram a Motown Records. Os hippies chegaram ao auge com Woodstock e revelaram ao mundo que a mulherada quer mais é dar, mostrar as peitolas e suar feito animais, porque o sexo escorregadio é mais gostoso mesmo. Na Europa, a cultura punk ganhava seus contornos mais radicais com o Sex Pistols e seus cuspes na coroa da rainha.

Por aqui, Elis, Caetano, Chico, Tropicália e o resto da galera que não tomava banho faziam seu papel, contestando através da música. Estudantes entravam na porrada, por levantarem a voz contra o governo, contra o fato dos meios de comunicação do país serem um monopólio de oito famílias (na época isso ainda era novidade) e pelos direitos civis, violentados em nome da "segurança nacional". O que é isso, companheiro?! Lula ainda trabalhava, não fazia a barba, não sabia ler e ainda era um simples líder sindical cheio de sonhos para um país coberto em desmandos.

Hoje tudo isso acabou. Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo que fizemos, vivemos a chatice da calmaria da falta de grandes objetivos, ao som de Jorges Vercillos e de um Michael Jackson branco. O cabelo black power deu lugar à oleosidade asquerosa dos EMOs, as hippies não mostram mais as peitchangas, não querem saber de sexo e assumiram um tom meio blasé, mas usam produtos Natura porque é socialmente responsável e seguram a onda de um banho não tomado. Lula virou presidente, a geração cara-pintada ainda acha que fez história, e os comunistas de hoje são essas malas sem alça, mas com lenço e documento, que ainda pensam, agem e falam em democratização dos meios de comunicação como falavam os seus pais. Aliás, ta afim de jogar o RPG dos Anos Rebeldes com a galera da UNE?

Definitivamente eu nasci na década errada, mas ao menos eu sei disso. Se você não sabe e vier me chamar de companheiro, serei obrigado a cometer uma deselegância.

Wednesday, November 01, 2006

Transtorno de quê???

A cada dia que passa, os cientistas especializados em transtornos psiquiátricos apresentam novos nomes para definir os mais estranhos comportamentos dos seres humanos. Não importa classe social, sexo, raça, idade, nada. Qualquer comportamento esquisito, fora dos padrões e – principalmente – repetitivo pode vir a enquadrar você, caro leitor do Boca, como portador de uma síndrome bizarra.

Só para ilustrar alguns comportamentos que se converteram em síndromes e transtornos nos últimos tempos, vamos citar alguns exemplos: aquele pirralho malcriado, mimado, sem-educação, verdadeiro projeto de vândalo, mas com inteligência suficiente para fazer pais e professores de trouxas pode acabar sendo classificado como portador de Distúrbio de Déficit de Atenção ou portador de Distúrbio de Hiperatividade. E ele pode mesmo sofrer desses distúrbios, claro!... Ou ser simplesmente uma peste de temperamento diabólico cujos pais terão a felicidade de poder socar tranqüilizantes e antidepressivos sem se sentirem culpados.

Aquela guria chata, cheia de manias, supersticiosa, medrosa e de imaginação fértil na verdade pode ser portadora de Transtorno Obsessivo-Compulsivo... ou pode ser simplesmente uma pentelha histérica e carente que encontrou uma ótima desculpa para ter que ser aturada pela família e pelos amigos sem questionamentos.

Mas o mais novo transtorno psiquiátrico revelado pelos cientistas, e que eu descobri lendo uma matéria no blog da revista Cláudia na semana passada, sem dúvida é o mais incrível de todos: a "feiúra imaginária".

A "feiúra imaginária", cujo nome científico é TDC – Transtorno Dismórfico Corporal – é um distúrbio que faz a pessoa enxergar no próprio corpo defeitos que não existem. Isso cria uma compulsão por cirurgias plásticas que, mesmo feitas repetidamente, nunca satisfazem as expectativas dos portadores de TDC. Logicamente, as mulheres são as maiores vítimas dessa moléstia psíquica.

Bizarro ou não, o fato é que esses distúrbios, transtornos ou síndromes nascem de comportamentos inocentes do dia-a-dia. Uma pequena mania, se reforçada, pode ir ganhando corpo até virar um monstro que descontrola toda a química cerebral e faz com que qualquer pessoa comum se transforme num Michael Jackson da vida. Ainda mais no Brasil, onde entrar na faca para caber num jeans 36 ou num sutiã 52 se transformou num procedimento banal e quase que obrigatório para as mulheres.

É por essas e outras, caro leitor do Boca, que é melhor não se importar tanto com seus pneus, sua muxibinhas, seu nariz de porquinho, sua corcunda, sua bunda murcha, suas verrugas, suas celulites, suas carecas lustrosas. Se preocupar demais com essas coisas pode acabar levando você a ficar maluco de verdade, tomando remédio e carregando um rótulo mais esquisito do que qualquer suposto defeito que o seu corpo tenha.

Michael Jackson que o diga!