Thursday, November 29, 2007

Capitalismo de merda

Tudo que tem início tem um fim. A história da humanidade nos provou que todos os ciclos econômicos um dia chegaram ao limite de suas possibilidades e contradições. Na era primitiva, isso aconteceu quando o homem começou a acumular riquezas. O feudalismo chegou ao limite quando foi impressa a primeira edição do Kama Sutra, contando todas as formas diferentes que a nobreza tinha de fazer sacanagem. Mas como chegaria ao fim a era capitalista?

Segundo os teóricos anti-capitalismo, o sistema se apóia no eterno e fundamental conflito de classes. O fim do capitalismo, então, aconteceria quando a tensão entre riqueza e pobreza se tornasse insustentável. Fica claro que essa galera não entendia nada e por isso o socialismo foi pra banha. O capitalismo se sustenta no consumo voraz. O consumo básico vai existir sempre, então o que gera a insanidade consumista é a novidade, o diferente. Fica, pois, claro, pelo menos pra mim, que o capitalismo só vai cair, quando as pessoas não tiverem mais o que comprar e comprarem qualquer merda.

E você achou que não ia viver para ver esse dia chegar. Comunistas, comemorai! Juventude universitária chata pra caral** do PSTU erguei-vos, porque o capitalismo americano chegou ao fundo do poço! Mike Tyson está vendendo potes de merda na Internet e tem gente que compra! Veja.

No site Celebrityskin.com, qualquer cidadão do planeta pode, por apenas U$ 31,00, comprar um pote com fezes do ex-atleta. Especula-se que estoque não seja problema, a questão é saber se a demanda acompanha a oferta. Agora, imagina se a onda pega e Bush, Kléber Leite, Ben Stiller e o Partido dos Trabalhadores se unem a Tyson para formar uma grande holding no segmento. Não sei se o mundo sobrevive a tanto fazedor de merda junto, comercializando o que fazem melhor e em maior quantidade.

Tuesday, November 20, 2007

Os 100 filmes que eu não posso deixar de ver

Conforme prometido, segue a lista de filmes que EU não posso deixar de ver. Se eu fosse você, não perderia também. Se você não entendeu de onde surgiu essa lista, clique aqui.

As 7 faces do Doutor Lao
Allan Quatermain e a cidade do ouro perdido
American Pie
Os Aventureiros do Bairro Proibido
Barrados no Shopping
Batman Begins
Bonitinha, mas ordinária
Braddock
Os Caça-fantasmas
Caçadores de Emoção
Caravana da coragem
Cegos, surdos e loucos
Círculo de Paixões
Comando para matar
Um convidado bem trapalhão
Corra que a polícia vem aí
O Corvo
Crazy People
Crocodilo Dundee
Curso de verão
Curtindo a vida adoidado
A dama do lotação
De Volta para o Futuro
Debbie & Lloyd
Os Deuses devem estar loucos
Dogma
Duro de matar
Elvira, a rainha das trevas
O Enigma da Pirâmide
Entrevista com o Vampiro
Espião por Engano
A Família Addams
Os fantasmas se divertem
A Fantástica Fábrica de Chocolates (o antigo, é óbvio)
Férias do Barulho
Férias Frustradas
Flashdance
Footloose
Forrest Gump
O Garoto do Futuro
Garotos Perdidos
Goonies
O Grande Dragão Branco
Grease
Guerra nas Estrelas - e sequências
Heavy Metal - Universo em Fantasia
Indiana Jones (todos)
Jovens demais para morrer
Jumanji
Karate Kid
Kill Bill
La Bamba
Labirinto
Loucademia de Polícia (todos)
O Mágico de Oz
Manequim
Máquina Mortífera
Matrix
Meia noite e um
Meu Primo Vinny
Midnight Madness
Monty Phyton (todos)
Um morto muito louco
Mulher nota 1000
Nova Iorque, cidade proibida
A Noviça Rebelde
Oscar - Minha filha quer casar
A Pantera Cor de Rosa (todos)
O Pestinha
Poltergeist
Porky's (trilogia)
A primeira transa de Jonathan
Um príncipe em Nova Iorque
A Quadrilha dos Sádicos
Quase famosos
Quero ser grande
Rambo - Programado para matar
O Rapto do Menino Dourado
Retroceder nunca, render-se jamais
Rockstar
Sem licença para dirigir
O Senhor dos Anéis
Os sete gatinhos
Sheena a rainha da selva
Sin City
Splash, uma sereia em minha vida
Superbad
Superman (todos)
Tango e Cash
Te pego lá fora
Team America
Um tira da pesada
Top Gang
Top Secret
Trânsito muito Louco
Os Trapalhões e o Rei do Futebol
Trocando as bolas
Tudo por uma esmeralda
O Último Dragão
Zoltan

Monday, November 19, 2007

Ossos do O(ri)fício

Bolei. Adriane Galisteu não pôde apresentar seu programa no SBT, fato ocorrido pela primeira vez desde 2004. Ok, ok... é claro que não foi por isso que fiquei bolado, afinal de contas, nem sabia que ela estava no SBT. Foi a causa: há coisa de 2 meses, Galisteu passou por uma cirurgia no reto (ou cu lírico, como preferir) e agora voltou a sentir dores.

Sério... eu poderia ficar duas horas aqui inventando factóides divertidos para justificar tanto a cirurgia quanto a recaída e confesso que muita sujeira passou pela minha cabeça desde que me sentei aqui para escrever. É um sentimento tão interessante ter tanta sacanagem diferente pra falar, é de uma riqueza tal que tantas opções chegam a me deixar confuso em meus próprios pensamentos. A coisa é tão forte que vez por outra eu simplesmente exclamo "CU!!!!" de forma espontânea, descabida e sem qualquer razão aparente no meio de todos e isso tem deixado as pessoas constrangidas ao meu redor.

Acho que jamais na vida tive tantas formas diferentes e simultâneas de sacanear uma mesma pessoa, porém vou deixar isso por conta das palavras da própria Adriane. Ela conseguiu ser melhor do que qualquer devaneio meu. Diz ela:

- Foi só um susto! Comecei a sentir dores de novo, mas tem a ver como estresse e com a vida que levo. (tá achando que eu to de sacanagem? Clica aqui e dá uma olhada na nota DE MOLHO - bem que podia ser DE OLHO, diz aí...)

Para adriane, eu dedico mais um momento:


Saturday, November 17, 2007

100 filmes que você deve ver?

O Blog Mente Aberta da Globo.com lançou uma lista daqueles que eles consideram os 100 filmes que você não pode deixar de ler. Dá uma conferida aqui. O livro sagrado da criação de listas, utilizado pela primeira vez entre os homens por Moisés, ao escrever os 10 mandamentos, oferece em seu prefácio uma recomendação a todos aqueles que estão decididos a ingressar nessa jornada. O texto traduzido do original em aramaico diz: "Se estiveres de fato disposto a criar listas, mantei su'alma desacansada e mente tranquila, porque tu farás merda. É inevitável. "

Pois bem... seguindo à risca o livro sagrado, a lista comete várias gafes. Não estou falando isso por eles incluírem o chatíssimo "As Crônicas de Nárnia", além de "Legalmente Loira" e "Jogos Mortais". Mas pô... como criar uma lista dessas e esquecer de obras importantíssimas da cinemateca internacional, tal qual "O Ultimo Dragão", "Os aventureiros do bairro proibido" e "Porky's" (a melhor trilogia da história)? Imperdoável, mesmo para o livro sagrado.

Em breve, será publicado nesse espaço a minha listagem dos 100 filmes que você não pode deixar de ver.

Friday, November 16, 2007

Ô Caetano, pára com iiiiiiiiisso!!!

Em determinado momento de sua carreira artística, Caetano Veloso foi levado ao Olimpo artístico-intelectual da sociedade brasileira. Quando se atinge esse patamar, o cara pode até dizer que quer dar pro Leonardo Di Caprio sem ficar reconhecido como bichona pela opinião pública - privilégio do qual o pobre Richarlysson não compartilha, coitado (sic).

A bem da verdade, eu sempre fui meio contrário à admiração cega sobre esse tipo de pessoa. Não sou de babar Caetano Veloso, não me furto a dizer que, apesar de grandes poetas, Chico Buarque e Bob Dylan cantam tão bem quanto, por exemplo, o José Roberto Wright, acho cinema europeu UM SACO e quero mais é que o time do São Paulo se foda com todas as 5 estrelinhas no rabo.

Pois bem, tá certo que a gente não fala nada quando não há porquê e não me nego em absoluto a gostar dos trabalhos dessas pessoas - não sou xiita também. Porém adoro quando vagabundo dá motivo. Estava eu sentado diante da tv, assistindo o malfadado Top TVZ. Depois de ver Beyoncé e suas coreografias de terreiro de macumba, Mariah Carey mostrar as tetas e achando que é gostosa e a Ciara dançando como Michael Jackson, não é que me entra um clip com Caetano Veloso sobre um palco cantando Rocks!!!

Sério, você já comeu melancia com molho de feijão, salpicados com noz moscada e soda cáustica? Pois é... soda cáustica, só no leite, falaí! Com vocal tropicalista (que lhe é característico, aliás, e funciona muito bem pro que ele vinha fazendo antes), trajes de professor de geografia, pulinhos de Gugu Liberato e guitarras meia-boca, você, um sujeito comum e cheio de dignidade, pode até conseguir um espaço no "Se vira nos 30". Não vai ter a menor chance contra o pitbull vestido de bailarina que assobia o hino do Botafogo, mas vai ter seus segundos de fama. Enquanto isso, direto do Olimpo para as telas do Multishow, Caetano faz um monte de zé mané babar e dizer que ele está reinventando o Rock nacional.

Tá certo que o Brasil está cheio de estúpidos convencionistas que batem palmas só porque meia dúzia de pseudo-entendido está batendo. A nossa sociedade é assim, ok, não reclamo porque aceito as regras do jogo (afinal, a torcida do Flamengo é a maior do Brasil e a que também tem o maior número de pessoas que não sabe escalar o seu time), mas alguém tem que fazer alguma coisa pelo cara. Um dia, quando tiver lá seus 80 anos (até menos) e não estiver chapado de Acarajé, ele vai colocar a mão na teste e dizer a si mesmo: Por que, meu Deus?!

Por isso, eu faço esse papel e, de coração, em respeito à sua história, eu peço: Ô Caetano, pára com iiiiiiiiisso!!!

Friday, August 17, 2007

Narradores e espectadores

Pergunta: Pra que serve o Galvão Bueno? Gente, a pergunta é séria, portanto, respostas como “Pra falar merda”, por mais óbvia que seja, por mais que eu concorde e por mais que ela de fato condiga com a realidade, não serão consideradas.

Sério... pra que serve o Galvão Bueno? Certas coisas estão de tal forma presentes em nossas vidas que não nos damos do que elas são. Me responda então: pra que você, amigo amante do esporte bretão e perfeitamente saudável no que se refere às suas faculdades visuais, precisa de alguém narrando exatamente o que você está assistindo na tv? E então, consegui fazer com que você se sinta um perfeito idiota? Se esse narrador for o Galvão, você passa a se sentir mais idiota ainda?

Estava lendo outro dia algo a respeito do discurso midiático e da relação de poder que se estabelece a partir do que se chama “definição da realidade”. Em linhas simples, a idéia aponta que quem tem o domínio do discurso, dissemina sua versão de realidade, quem se coloca na possição passiva, aceita e assume essa verdade como sua. Então, o narrador esportivo tem a incumbência de te dizer o que você está vendo e o comentarista (profissão mais fácil do mundo, uma vez que o sujeito é pago para olhar e criticar, sem ter o compromisso de interferir diretamente na disputa, seja jogando, seja comandando) de interpretar, enquanto você assiste e aceita. Mas aí você vai me dizer: “Ah... mas eu acho o Casagrande um imbecil. Quase nunca concordo com ele”. E aí, eu pergunto: e daí ?

O esporte é apenas um exemplo, mas o fato é que essa aceitação é uma tendência que tem se espalhado de forma assustadora. Acostumados a receber impressões prontas de narradores e comentaristas esportivos, simulações da realidade impostas por novelas, filmes e seriados e de toda uma programação midiática, cada vez mais nos contentamos em observar. Acompanhar a vida dos personagens até que é divertido, além de ser mais seguro, já que as consequências dos atos de cada um se desenvolvem somente na trama. E Veja esse seriado que temos agora: um senador federal vende benefícios a empreiteiras e demais corporações em troca de favores financeiros. Ele sonega impostos, deixa de declarar o que deve e a imprensa relata cada um de seus negócios nebulosos. Tudo isso num ambiente em que a literal compra de influência é institucionalizada como prática corrente e normal, jogando no lixo todos os princípios éticos que exige a representação da voz de um povo. “Que safado!”, pensamos e seguimos esperando que o mocinho da história tome uma posição e tire o sujeito de lá. “Um dia, o povo vai acabar com toda essa safadeza”.

Aí eu te faço mais uma pergunta: de que adianta você dizer que não concorda com o que “a mídia te impõe” e que tem a sua própria opinião, se o principal da história, que é observar sem interferir e aceitar que alguém se dê ao direito de instituir uma visão do real, ainda que você não concorde com sua opinião, você já aceitou? Ou seja, meu querido, você é o “imbecil do Casagrande”.

Monday, August 06, 2007

Como se faz

- Primeiro você chama os mateiros e os peões. Tem que ser gente de confiança, assassinos arrependidos que querem trabalhar honestamente com terra e gado; refugiados naquela terra escondida, cujo nome só sabem aqueles que moram lá.

Os leva mata adentro atrás do jirico ou pick up, com galões de gasolina bem cheios, depois de ter ‘encercado’ o gado.

Tem que ser no dia bem quente e no final da tarde. Confirmando a direção do vento, se está contrário ao aceiro e nunca a favor do vizinho, vai-se jogando gasolina no mato e nas moitas pequenas e acendendo com isqueiros Bic. Depois, é só cuidar para não passar o aceiro do vizinho. Tem que ficar ‘esperto’ pois o fogo pode ‘virar’ a qualquer momento.

E não precisa esperar anoitecer para ver o começo da atrocidade e ouvir os gritos de animais silvestres e das árvores sofrendo horrores com o fogo incontrolável. O barulho é horrível, a fumaça e calor sufocam mesmo quando distantes. Não escapa onça, não escapa cateto, não escapa anta, cervos, macacos, cabras, paca, quati, nada. Destruição de uma forma que poucos viram ou verão. Depois, silêncio e estalitos, árvores mortas, a brasa, a devastação.

Tem que beber muita água. Nem se sabe de onde é a água, mas ela é quente e ‘braba’, no dia seguinte dá febre e diarréia explosiva. Nem se sabe se é a água, ou a fumaça maldita, mas ninguém escapa da ‘doença do fogo’. Não tem problema, só dura dois dias.

Aquilo que era verde, com árvores que só poderiam ser abraçadas por mais de seis pessoas, com plantas magníficas não encontradas em nenhum outro lugar no mundo e fauna de parte de um paraíso, deixam de existir. É a formula do homem para que o céu sempre azul encontre na terra o cemitério da perfeição.

Nessa área nunca mais casais de araras azuis ou coloridas com seus gritos alegres aparecerão, ou urubu rei imponente ou a coruja cinza que avisa os habitantes da floresta que o homem chegou. Nessa área somente alguns tocos queimados mostram vida, o lugar fica escuro, dá a sensação de morte. Mateiros mais supersticiosos querem logo ir embora, para não serem castigados pelo ‘Pai da Mata’.

A terra, agora negra, ainda será habitada por um verde rasteiros das pastagens, o gado branco pastará, alguns cavalos correrão por ali, mas isso ainda vai demorar.

Agora tem que pagar os mateiros e peões, fazer recibo de R$ 15,00 para cada um, não perguntar o sobrenome da maioria para não levar tiro, já avisar que depois ‘da chuva’, tem serviço de ‘roçar a juquira’ – isso para fazer política e não arrumar inimizade com aqueles que podem te matar se achar que os reconheceu do Linha Direta.

Depois, tem que avisar o IBAMA que algum bandido ‘colocou fogo nas terras', dar queixa na delegacia, fazer toda a burocracia não só para não ser multado, mas também para não pagar propina para agentes diversos, desde IBAMA até do INCRA.

Meu pai tem terras lá em Aripuanã, MT. Faz divisa com a floresta amazônica...

Sunday, July 29, 2007

Mais uma inversão de valores

Provavelmente você já assistiu, já viu ou ouvir falar do ‘E! Entretenimento’, um canal de TV voltado para quem gosta de celebridades americanas ou ver mulher se expor vulgarmente ao ridículo. Se não viu, não está perdendo nada, a não ser saber quaisquer coisas (das mais idiotas até as mais estúpidas) sobre celebridades e ver um monte de gente mostrando peitos e genitais em “festas” que a programação filma mundo afora como sendo “as melhores do mundo” (imagine qual é “a melhor festa do mundo” aqui no Brasil).

Bom, se já viu, vai entender o que quero dizer sobre a programação diurna inútil, e a programação noturna imprópria, principalmente para um canal chamado “entretenimento”.

Acredito que tenham um bom ibope mostrando as celebridades como seres humanos ou até como pessoas normais, também acredito que os programas de fofocas sobre artistas, atores e similares lhes rendam bons ganhos com os anúncios, pois todos sabemos quão grande é o interesse das pessoas pelas vidas dos seus artistas preferidos, uma boa parte ávida não só por saber mas também para ter aquele gostinho de estar mais próximo do ídolo. Mas o que não dá para entender é : por que passar (e muitas vezes em horários impróprios) festas no mundo todo, com relatos de pessoas completamente desconhecidas que as classificam como “a melhor festa, ou a mais badalada do planeta”, mesmo quando todas, indistintamente, mostram sempre: mulheres mostrando os seios ou se beijando – já vi pênis de vários tamanhos e cor também - regadas a muita bebida, muita esfregação e cujo único intuito é sexo livre e com qualquer um, numa libertinagem sem tamanho. É a mesma coisa todas as noites, algumas vezes passa à tarde também: close em peitos, em bundas, homens dançando pelados, algumas garotas gritando “essa é a melhor festa do mundo”, outras se lambendo, homens se esfregando em algumas alcoolizadas, mais peitos aparecendo e alguns homens relatando que “não há melhor festa que essa em qualquer outro lugar do mundo”. Só que no dia seguinte, esse programa está em outro país, numa outra festa, mostrando exatamente a mesma coisa, quando não pior.

E eu me pergunto como é que uma coisa assim pode dar ipobe a ponto de ter essa programação todas às noites, muitas vezes de dia também?

Será que existem tantas pessoas com vidas tão medíocres, insignificantes, banais e desprezíveis que sentem tesão só de olhar genitais e peitos? Seria uma curiosidade dos mais velhos – aqueles aposentados e inúteis que não têm mais o que fazer - que querem saber como são as festas hoje? Será que é a tendência atual e eu sou uma velha rabugenta e moralista que não vê a necessidade, em uma festa, da mulher se colocar como um objeto de prazer, se portando sem um pingo de auto-estima e de forma tão mundana? Ou sempre foi assim, só que não televisionado, e eu, por estar num circulo mais pobre – onde divertimento em festa consistia em dançar, estar com amigos e no máximo ficar com alguém – jamais freqüentei festas dos quais o intento é sexo, cujo entretenimento está voltado unicamente para a promiscuidade?

Não acredito que isso possa ser uma normalidade, apesar de já ter freqüentado e muito a noite e conhecer bem pessoas que iam e até hoje vão a festas como caçadoras vorazes, selvagens que sem afeto, buscavam no sexo algum conforto, uma noite a menos de solidão. Mas nenhuma delas, nem nos piores inferninhos que freqüentei, com qualquer um que eu tenha saído e conhecido e ficado, expôs sua nudez como oferenda ao primeiro que chegasse, diferente de hoje, e nessas festas do ‘E! Entretenimento’. Uma pena.

Friday, July 27, 2007

Breve história da emetevê, como diria o amigo do ministro

Após anos no ar, a MTV desenvolveu um idioma televisivo muito peculiar. Foi a famosa linguagem videoclipe, feita de muitos cortes, tomadas rápidas, com imagens por vezes desconexas e aparentemente sem sentido. Funciona. Ajuda a distrair. Você ao mesmo tempo está assistindo algo, sem precisar sequer de dois neurônios para entender coisa alguma.

Parece também uma máquina do tempo. Na verdade, deveriam colocar televisões sintonizadas na MTV em repartições públicas, alguns bancos e, claro, aeroportos. Se bem que MTV há muito tempo deixou de ser sinônimo de música, quanto mais videoclipe.

Claro que esse processo não é algo tão simples assim. Cada célula do corpo, em estado de hipnose, se comporta como criança diante do corredor dos brinquedos. Tudo atiça desejos, uma verdadeira suruba platônica. Quem assiste, deseja. Quem é assistido, provoca. O máximo que pode.

Mas essa estratégia poderosa não foi suficiente. Vez por outra, algum revolucionário colocava um clipe da Legião Urbana ou quem sabe até um Neil Young no meio da programação. E algumas jovens mentes em gestação se perdiam. Então criaram os programetes. De início curtos, logo invadiram o restante da grade de atrações. Os cortes confusos e psicodélicos continuaram, dessa vez sem letra, sem música, apenas como intervalos para os intervalos comerciais.

Por mais estúpidas e cansativas que fossem, as atrações dominantes não enfrentaram contestações. Pelo contrário, a MTV planeja oficialmente extinguir os videoclipes. Zero riscos de qualquer infusão de pensamentos ameaçadores. Muita informação, nenhum conhecimento. Cortes a todo o tempo, nos intervalos de encenações patéticas, tendo como fundo a estupidez humana. A realidade é o Big Brother perfeito para a MTV.

Monday, July 23, 2007

Ora, e as passagens aéreas ainda vão subir.

Como se não bastasse medalhas jogadas ao leu, as passagens irão subir.

E os aeroportos estão lotados, filas descomunais; cansaço e comodismo mesclado nos rostos, o cheiro de impaciência misturado ao “bovinismo” característico do povo brasileiro, acostumado a ver pacificamente mais desastres, mais gente morrendo e... continuar na fila para pegar seu vôo. “Convenhamos, ir de avião é bem melhor”.

O governo garante: os preços vão subir e todo transtorno é válido, e é feito pela segurança aérea. Esquece-se que o avião da TAM já estava no chão. O problema não é nas alturas, é aqui, em terra, com gente que possivelmente nunca soltou pipa algum dia.

Mas quem vai dar o braço a torcer, e para que fazer algo? Descaso do governo, nossa mansidão vendo tantas omissões, a dor estampada na TV, o menosprezo ao ser humano, avareza das empresas, corrupção. Vemos isso em todos os setores, porque seria diferente agora? A fila continua, a fila anda.

Passivo de colocarem a culpa no piloto, também na repimboca da parafuseta do avião, ou simplesmente não responder nada para ninguém, como fizeram com o ultimo desastre que envolveu o Legacy – coitados dos americanos. Não há quem cobre, não há o que fazer.

Não importa, morreram mais de 150 ano passado, mais 200 agora, até ACM morreu, nada será feito para melhorar o esquema aéreo no Brasil assim como nada consegue tirar Calheiros do Senado. É muito dinheiro envolvido, muita gente envolvida e o pouco caso das pessoas, tanto como eleitores como passageiros. Pessoas que, no máximo, conseguem soltar uns gritos quando a câmera da Globo passa e pronto, já fez seu brilhante papel de mostrar seu ultraje.

Não quero falar e nem imaginar a dor dos que ficaram desse caos todo, não existe isso. Mas quero registrar que por um bom tempo eu não vou pegar avião algum e recomendo aqueles que forçosamente não precisam "plainar", que também o façam, pois quem sabe: sem fila, alguma coisa mude.

Thursday, July 19, 2007

Tempo pra tudo

É preciso uns 144 anos para se escrever uma trajetória de vida.
A cara de avô chega aos 70.
Com 65 (se você for homem) ou 60 (se você for mulher) é possível concluir uma vida profissional.
Aos 40, tem início uma fase que, na imensa maioria dos casos, dificilmente se sai vivo.
Em 30 anos, você já está pronto para ser pai (é assim que eu vejo, pelo menos), mas isso varia muito.
Na casa dos vinte, geralmente, vem o diploma.
Com 21, o torcedor do Botafogo comemora um título.
Com 18 se tira carteira de motorista e é possível entrar em qualquer night que role por aí (uhul!).
Dezesseis é a idade média para a perda da virgindade.
Com 15, a menina debuta.
Foram necessários 12 anos para Lula fazer a barba decentemente
Em 10 anos você já acha que é gente.
É preciso 8 anos de mandato para empurrar várias paradas com a barriga.
A cada 4 tem copa do mundo.
Dois anos depois, tem Olimpíadas.
Não foi preciso nem 1 ano para o brasileiro se dar conta de que a "esperança" não ia dar em nada.
Leva 9 meses para se conceber uma nova vida e toda uma trajetória para se criar um filho.
Em 8 meses se faz um brasileirão.
Em 6 se conclui um período universitário.
5 meses o brasileiro trabalha só para pagar impostos.
Em 1 mês se planeja uma viagem.
Na situação atual, leva-se 2 horas no check in do aeroporto.
Uma hora e meia de Porto Alegre a São Paulo.
Por minutos (de sorte) você pode perder um vôo.
Em alguns segundos de completo desespero você se dá conta de o fim é inevitável.
Um piscar de olhos é o suficiente para que toda uma vida seja revista por inteiro diante de 186 pares olhos.
Num único e incontável instante, o colorido se torna preto.

Porém não há tempo que cicatrize a dor da perda de um ente querido em um acidente estúpido, nem a revolta porque em aproximadamente um ano nossas autoridades não tomaram qualquer providência realmente efetiva quanto ao caos aéreo que se estabeleceu neste país, desde que o Legacy colidiu com o vôo Gol 1907. E toda essa negligência é resultado da mentalidade dos nossos políticos, que passam todo seu mandato ocupados em bolar estratégias de como aumentar seus salários, como obterem vantagens, incrementar seus patrimônios, fazer lobby e montarem esquemas para defenderem a si mesmos, quando um eventual escândalo vem à tona.

Quanto tempo mais vamos assistir impassíveis espetáculos como este?

Wednesday, June 20, 2007

Nada Demais

O mundo de hoje é capaz de coisas espetaculares, nunca antes imaginadas. Não sei se é uma questão de avanço da ciência e do pensamento, trazendo a reboque a conseqüente evolução da sociedade, ou se este momento é o resultado coerente da linha de desenvolvimento das relações humanas pós-globalização, portanto sem vinculação científica.

Veja você: na semana passada a maior das pequenas patrícias foi presa sob acusação de dirigir com licença vencida. A herdeira da mega rede de hotéis Hilton, dizem, dividindo a cela com presas comuns e privada de utilizar seus cremes hidratantes para pele e camisolas de seda paquistanesa. Após uma série de eventos, que incluíram ataque de nervos, libertação para cumprimento de pena em prisão domiciliar e manifestação virtual popular contrária a tal decisão judicial, Paris Hilton – a Narcisa Tamborindeguy Worldwide - foi reconduzida ao xilindró onde, segundo a jornalista Mariana Sangalo Trevisan, permanece encarcerada sob olhar atento da imprensa internacional e dos policiais que, certamente, esperam mais um de seus acessos, no qual ela escolha um deles para manter relações e novamente jogar na lama o nome da família.

Não se surpreenda se por todo o mundo você encontrar patricinhas desfilando vestidos e terninhos zebrados, assinados por Versacci, Armani, Gucci, Rauph Lauren, dentro desse “novo conceito estético que expressa os tempos atuais, onde é forte o conflito entre o desejo de liberdade e tudo o que deve ser aprisionado para que essa libertação aconteça de forma plena, segundo a pós-modernidade em contexto de hiperglobalização do indivíduo enquanto ser e enquanto todo”. Não se surpreenda também se esses tempos de conectividade, interatividade, capitalismo selvagem e estímulo institucionalizado à invasão de privacidade que deram corpo e sucesso aos reality shows, produza o primeiro programa do gênero que acompanha a vida de uma socialite presidiária e seus dramas de convivência com esse novo universo.

E todo esse esforço, todo esse foco sobre Paris, toda sua legião de fãs e seguidores ao redor do mundo, tudo isso tem uma razão de ser. Só os radicais não vêem que ela é a principal responsável pelo... Ah... Err... Porque ela conduz... bem... porque suas palavras... As jovens seguem sua conduta, ela é um ícone porque, assim como Gisele Bündchen, representa...

É exatamente esse o ponto. Ela representa o nada. Paris Hilton é o principal ícone do vácuo referencial que caracteriza esses pobres tempos - superficiais e marcados pelo signo de uma transitoriedade que impede o estreitar de relações entre o interessado e o objeto de interesse e que, portanto, não promove vínculos ou se aprofunda. Ela é o mito que só figura. Justo por isso, talvez, ela represente, anos depois da morte de Andy Warhol, um motivo de caracterização e representação mais perfeito do que Marilyn conseguiu ser, por ter, por detrás de todo o fenômeno construído, um conteúdo que o justificava. Paris é mais um simulacro do também falecido Jean Baudrillard. Ou seja, Paris Hilton é uma mera gravidez psicológica.

É isso que eu dizia ser o mais espetacular dos dias de hoje: fazer o nada representar tanto.

E na real, eu nem sei por que estou falando nisso.

Wednesday, June 06, 2007

28

... anos se passaram desde o dia em que a senhora minha mãe estribuchava numa maternidade da Tijuca, fazendo uma força danada para nascer o pequeno estrupício que eu era. Na época, ela sonhava com um futuro próspero para seu rebento. Um fututo sem excessos, mas absolutamente estável e seguro.

Assim, ao longo de toda a minha vida, rolou uma verdadeira campanha de imersão 24h para que, em primeiro lugar, eu estudasse (afinal de contas, o meu conhecimento é o único bem que jamais ninguém pode me tirar), fizesse uma faculdade (federal) e garantisse vaga no funcionalismo público para nunca ter que esquentar a minha cabeça com os famosos passaralhos, característicos da iniciativa privada.

Porém, reconheço, os sonhos e rebeldia da juventude me fizeram seguir as palavras mais repetidas por jovens adolescentes em vias de escolher seu caminho profissional: eu vou trabalhar com algo que me dê prazer, que eu goste, com o qual eu me identifique e que realize meus sonhos. Hoje, formado e trabalhando, me pergunto quem foi o corno que inventou essa bravata?! Provavelmente algum idiota cheio da bufunfa, em uma desocupada tarde de terça-feira, após o seu jogo de gamão com patriarca dos Albuquerque Cavalcanti e Silva.

Hoje, pensando no sentido prático da vida, vejo que prazer a gente busca no sexo. No trabalho, a gente consegue (ou deveria) dinheiro e aí me recordo de outras palavras estúpidas, provavelmente proferidas em primeira mão por um outro playboy cheio da nota: Dinheiro não traz felicidade. Pra quem?! Beleza, até concordo, mas pô... prefiro ser um deprimido rico e cheio de condição para torrar grana em futilidades mil do que um triste pobre, que, além de tudo, tem ainda 28 problemas a mais com o que se preocupar.

Porém o emprego ideal para mim hoje, aquele que eu considero a menina dos meus olhos me foi vetado antes mesmo de eu ter qualquer vestígio de opinião crítica. Eu acredito que o pertencimento ao meio que desejo é conquistado antes mesmo do nascimento, é preciso ter berço, um histórico familiar, uma trajetória marcante, senão você não vence. O sujeito será um estranho e o isolamento é sempre a pior situação que um ser humano pode vivenciar. Então, como fui privado desse direito, só posso projetar essa vida dos meus filhos, começar a montar as condições necessárias para sua chegada e iniciação profissional e torcer para que eles entendam aquilo que eu não entendi. Por isso, já decidi. Vou me separar da minha mulher e ter meus filhos com uma garota de programa.

Assim, meu filho poderá ter um emprego que lhe dará total estabilidade. Que lhe permitirá ter controle sobre seu alto salário, aumentando em pelo menos 28% seu valor quando bem entender. Que cobrirá seus gastos de viagem de férias, em nome de suas funções profissionais. Que não lhe exigirá exclusividade de funções, de modo que ele possa conseguir trabalhos free-lancers no ramo de venda de influência, afinal, é sempre importante incrementar o seu "pobre" orçamento. Que dará abertura para que lobistas paguem as pensões alimentícias de suas futuras ex-esposas e banquem noitadas com prostitutas como um dia fora a sua mãe. E que, por fim, lhe dará imunidade jurídica e contatos fortes para que, em caso de alguma irregularidade, tudo seja jogado para debaixo dos panos do esquecimento e nada da maior gravidade lhe aconteça.

Só sendo muito filho da puta.

Wednesday, May 30, 2007

Maior que as pernas

Não sei bem como começou. A primeira vez que fiz, que eu me lembre, foi no colégio.

Eu não conseguia entender de maneira alguma aquelas contas, aqueles números rabiscados no quadro negro. As aulas se tornavam uma tortura diária. No final do mês, chegava o boletim, horrível, com a nota quatro brilhando e ofuscando completamente as outras ao seu redor.

Posso descrever a sensação da época em detalhes. Não é muito diferente do que acontece hoje. O frio na barriga parece crescer e se torna um abismo cada vez mais próximo de meus pés. A boca fica seca, nada a ver com sede, é como se toda água de meu corpo fosse bebida com gosto por alguma criatura maligna. Uma força absurda se manifesta, se espalha até meus pés e ali fica, como se eu pudesse saltar até às nuvens.

Então, sem que eu pense muito, me vejo correndo. E corro, corro, corro... as pernas praticamente se tornam meu tapete mágico, me levando para lugares que desconheço, sem que eu tenha qualquer controle quanto a direção a ser tomada.

A situação foi se repetindo, aconteceu no vestibular para Direito, onde perdi três anos tentando entrar, até optar por uma universidade que apenas pedia que eu pagasse a matrícula para ganhar a vaga. Não me entenda mal, não sou uma pessoa estúpida, mas ao sinal da menor dificuldade, ao invés de forçar meu cérebro a trabalhar contra isso, via esse mesmo impulso transferido para minhas pernas. E novamente quilômetros de lenta agonia e êxtase, até parar, exausto, muitas vezes em outras cidades.

Tentei aproveitar esse dom maldito. Me inscrevi em maratonas e, devido a meu excelente e involuntário condicionamento físico, disparava na frente. No entanto, bastava alguém se aproximar para o velho mal se manifestar. Perdia completamente o controle e saia do trajeto previsto, com minhas pernas me levando para lugares isolados, longe de qualquer ameaça.

Por três vezes tentei me casar. Cheguei perto de conseguir. Nas duas primeiras vezes, bastou que eu vestisse o terno para que a locomotiva do medo entrasse em ação. Devo ser a única pessoa do mundo a passar o dia inteiro do próprio casamento correndo. Na terceira vez, controlei o demônio maratonista com muito sacrifício e a ajuda de alguns amigos. Com anestesia local nas pernas, foi fisicamente impossível fugir. Calculamos tudo para que eu estivesse recuperado uns 15 minutos antes da cerimônia. Esquecemos do principal. A caminhada até o altar transformou-se em evento atlético que se estendeu até às 6h do dia seguinte.

Com muito custo, me formei após nove anos de faculdade. Obviamente, não estive presente na entrega dos diplomas. Como advogado, era brilhante nos bastidores, poderia livrar, em tese, a cara de qualquer um que defendesse com facilidade. Mas na hora de encarar o júri, o juiz e a promotoria, a tragédia jamais me dava trégua. Eu disparava para fora do tribunal, derrubando inclusive alguns seguranças pelo caminho. Graças a esse comportamento bizarro, como punição, vários juízes me colocaram na cadeia por alguns dias.

Conformado, decidi trabalhar cercado por quatro paredes apenas. Fiz minha fortuna como consultor jurídico de grandes corporações, ajudando-as, ironia das ironias, a fugir dos seus maiores problemas. Minha doença jamais me abandonou e foi se manifestando cada vez mais, ao menor sinal de perigo. Aconteceu em supermercado, bancos, na academia e até em pleno trânsito. Fui me tornando sozinho e distante da vida em sociedade.

Na última semana pensava ter encontrado a solução. Sem alimentar meu corpo por cinco dias, corri pela primeira vez voluntariamente. Queria ver como minhas pernas iriam fugir de si próprias, de sua própria destruição, talvez um confronto tão violento me livrasse da maldição. Corri até desabar e fui sentindo lentamente o calor desaparecer de meu corpo, cercado por pessoas que nunca tinha visto na vida. Minha tragédia enfim mostrou sua cara, mas preveria ter permanecido em minha triste ignorância. Nesses anos todos, minhas pernas foram meros instrumentos da covardia de meu espírito. E agora, finalmente, ele correria para sempre, sem que eu nada pudesse fazer a respeito.

Tuesday, May 22, 2007

Sobrenomes

- Então você deve conhecer o Rubens, lembra? Aquele cara famoso na cidade por ter roubado a peruca do prefeito?
- Isso! Claro que sim! Até cheguei a estudar com ele uma época...
- Que coisa, quem diria que a gente cresceu na mesma cidade, conhecia as mesmas pessoas, pena que nunca nos cruzamos... Bom, a conversa está ótima, só tenho que pegar seu sobrenome direitinho, sabe como é, a operadora pede tudo em perfeita ordem para emitir o cartão.
- Ah, sim, claro. O sobrenome é Fritsch. Quer que eu soletre?
- Com certeza.
- F de fantasia, R de rio, I de igreja, S de sol, C de céu e H no final.
- Certo, um minutinho e já volto.

Naquele minuto, André analisou todos os possíveis significados para aquelas palavras, auxiliares no ato de tornar clara a identidade de cada uma das letras do complicado sobrenome. Seriam elas, as máscaras escolhidas por Júlia para definir cada letra, o júri que decidiria pelo futuro dessa conversa, até o momento promissora. Nem sempre se chegava tão longe assim, sempre havia outras preliminares, verdadeiros muros de contenção que só eram atravessados com determinada combinação de fatores.

Naquela tarde, o contato telefônico, que começara em tom formal, típico entre dois robôs britânicos, tinha chegado ao descontraído rumo principalmente pela junção harmoniosa de nome, sobrenome, timbre e algo que André gostava de chamar de personalidade vocal, tão presentes em sua interlocutora. E para completar era um sobrenome difícil, impossível de transcrever pela simples audição da soma de suas letras. Uma mulher complexa, sem dúvida. No entanto, nada disso teria força sem um padrão adequado de significação nas letras daquele sobrenome, que por si só dizia ao operador de telemarketing que aquela era uma mulher com cabelos tingidos de loiro, solteira, elegante e, provavelmente, com padrão de vida elevado. O primeiro nome dela, Júlia, não poderia ser outro. Como seria de se esperar, seu tom de voz era dinâmico, a eloqüência mostrava sua energia e a sua memória privilegiada estava comprovada na facilidade com que lembrou de números de diversos documentos sem hesitação. Ela era extremamente amistosa, mas sem ser vulgar. Deveria ter um sorriso lindo.

Diante de perspectivas tão animadoras, ele relutou em fazer a análise fria, mas essencial que sempre fazia em situações como aquela. Quer dizer, nem sempre. Há tempos atrás, André ignorou solenemente quando Isabel Bordignon concedeu ao G máscara bastante duvidosa. G de gangorra, ela disse. Dessa imprudência se arrependia até hoje, aquela foi a relação mais instável e precária que já experimentara. O pressuposto para que ela estivesse bem era vê-lo mal. Adorava-o ver de cima, majestosa e fazê-lo sentir-se o último dos seres.

Outra vez foi um mísero C. Mesmo com R de romance, E de Europa e L de limpeza, tudo foi abaixo com o maldito C. Fernanda Ciarelli vestiu o C com a perigosa palavra cachorro. E assim foi: a imagem de Nandinha sobre o universo masculino era tão carregada de desconfiança e ódio que André foi obrigado a deixar de andar com amigas, conhecidas e até mesmo primas. Por fim, terminou tudo antes que Fernanda sentisse ciúme de si própria.

Dessa vez não cometeria esse erro. Não pode se esperar muita coisa de quem tem um H no final do nome. Tão previsível, tão inútil. É uma letra quase sem máscaras, tanto que Júlia nem se dava ao trabalho de utilizar uma para identificar sua presença inconfundível. Se ao menos tivesse dito H de humanidade. Mas aí também estaria denunciando falta de inteligência ao não perceber quão supérfluos são quaisquer acessórios que definam essa letrinha medíocre, sem sequer sonoridade própria.

- Infelizmente, senhora, seu cadastro não foi aprovado, tenha um bom dia.
- Espera, espera, André! O que foi que houve!?

Telefone no gancho, os olhos correm em busca de sobrenomes que valham a pena. Beatriz Sulchevskida brilha na lista.

Friday, May 04, 2007

O Rei

O Rei andava incomodado. Sua vida era agora literalmente um livro aberto. Um fedelho metido a jornalista, após 15 anos à sua volta, remexendo detalhes do seu passado, enfim lançava a biografia real. Ninguém pedira ao Rei autorização para contar sua história. E o Rei tinha dificultado essa empreitada ao máximo. Na década e meia de pesquisa feita pelo incansável admirador, o Rei ignorara sua insistência plebéia com rigor típico das mais refinadas dinastias. Nesse tempo todo, não havia se preocupado nem mesmo em olhar para a insignificante criatura.

No entanto, a corte real, não vendo mal algum em contar a trajetória gloriosa do Rei, abasteceu o livro em gestação. O próprio Rei acabou revelando alguns detalhes, em diversas declarações dadas em épocas remotas, a outros jornalistas mais comportados. Mesmo com tantos empecilhos ao seu trabalho, o fascínio do jovenzinho repórter pelo Rei só aumentava. Tinha toda a obra cultural do Rei devidamente guardada. Colecionava tudo que envolvia seu ídolo. Recortava e arquivava entrevistas, fotos e mini-biografias feitas por revistas.

Ninguém poderia fazer algo assim e ainda sair impune. O Rei precisava manter sua aura. Era um Rei como jamais houve. Seus feitos trouxeram uma nova era. Proibiu em sua terra o uso do marrom, aquela cor maldita, a favorita do próprio demônio. Fez todos os seus súditos abolirem palavras negativas. Alterou e deixou de executar parte de sua própria obra, a fim de corrigir equívocos que poderiam incentivar a libertinagem e outros maus hábitos. Sacrificou a qualidade de cada canção sua, adotando a temática mais patética possível, para assim tornar sua mensagem popular entre os intelectualmente menos privilegiados daquele reino perfeito. Agora não seria diferente. Para restaurar a harmonia em seu mundo, mostraria mais uma vez sua sabedoria e tiraria de circulação aquela obra profana.

Ninguém poderia relembrar agora, justo quando consolidava sua imagem de Rei, dos atos rebeldes daquele outrora plebeu atrevido. Aquele moleque conquistava as mulheres mais desejadas da nação, decidia brigas no braço e varava as noites compondo melodias e letras cheias de atrevimento. Sua presença de espírito era contagiante, cativava qualquer que estivesse por perto. Esse não poderia ser um Rei. Uma pessoa assim não passava de um plebeu colecionador de amigos e fãs. E destes, o tal jornalista insistia em ser um dos mais ardorosos. Um Rei não pode se rebaixar assim, um Rei não precisa de amizades, um Rei se limita a acumular súditos.

Tuesday, April 24, 2007

Questão de didática

Segundo Lula, “é melhor transportar aluno do que Fernandinho Beira-Mar”. A frase saiu em meio a discurso realizado em Brasília. O presidente refutou a proposta de redução da maioridade penal e alegou ser mais barato construir escolas do que presídios. Lula defendeu ainda investimentos em educação, finalizando que as crianças precisam de oportunidade, carinho e amor. Não esqueceu de reforçar a promessa de equipar todas as escolas públicas do país com computador e internet. A eloqüência do presidente incluiu ainda ironias como: “então, vamos começar a punir as crianças desde já, antes que virem bandidos”.

Com certeza é mais barato construir escolas no Brasil do que presídios. Não poderia ser diferente. O ensino público brasileiro é um dos piores do mundo. A maioria dos alunos chega ao final do Ensino Fundamental sem a compreensão do que lê, ou seja, com idades por volta dos 14 anos são analfabetos funcionais. Manter e inchar um sistema de tão baixa qualidade não deve custar muito.

Por outro lado, presídios continuam entupidos de gente, com métodos didáticos muito mais eficientes do que a rede de ensino público brasileira, capazes de transformar qualquer ladrão de galinhas em bandido de alta periculosidade. Chamar isso de prisão é exagero. O Brasil já conta com uma população de meio milhão de foragidos. Está mais do que provada a ineficácia das jaulas brasileiras.

Falar de oportunidade, carinho e amor pra esses filhos do descaso chega a ser deboche. Pensar que o ensino público vai garantir o futuro dessas crianças é puro populismo. É burrice encher de computadores escolas que pagam salários de fome a professores que mal sabem ligar essas máquinas. Assim como é ignorar que desde já essa geração de miseráveis está sendo punida. Não com a cadeia e sim com a certeza de que a escola pública brasileira não só não tem forças para mudar esse destino trágico, como também é parte essencial do problema.

Tuesday, April 17, 2007

Argumentos

Talvez só alguma baixaria em tempos de Big Brother dê mais audiência do que a causa do aquecimento global. Subitamente, as pessoas ficaram boazinhas com o planeta até então confundido com lata de lixo. Multinacionais compensam o estrago que fazem plantando árvores. Combustíveis alternativos, como o álcool, se tornam bandeira de salvação. Desfiles de moda lançam coleções inteiramente feitas com material reciclado.

Isso não é ruim. Mas a tese que sustenta tanta boa vontade é fraca. Até agora, o principal argumento é que nossa espécie está ameaçada com essa história toda. Provavelmente está.

Na verdade, essa preocupação surgiu por motivos mais escusos. Com o calorão crescente, bons negócios estão em risco. Simples assim. É questão econômica. Não ambiental, moral ou científica.

Essa mania de apelar para a consciência do ser humano até funciona, mas por pouco tempo. Questões assim precisam ser encaradas da maneira mais efetiva. Basta apelar para o que move pessoas capazes de fazer algo relevante para mudar situações como essa, sejam elas dotadas de senso moral ou não.

Por isso, mesmo diante do pavor diante do termômetro, não consigo ter maiores temores. O aquecimento global não causa apenas a destruição de ecossistemas, sofrimento de populações costeiras ou verões insuportáveis. Aquecimento global causa prejuízos e isso sim é inadmissível para qualquer homo sapiens.

Wednesday, March 28, 2007

Canções

Sempre há algo de triste quando se compõe para alguém. Diferente de uma fotografia, por exemplo, uma canção não desbota. Não há como rasgá-la. Você não pode nem mesmo jogá-la em uma velha caixa de sapatos. Aquela melodia vai te assaltar no meio da mais banal de suas atividades. Na curta ponte entre vigília e sono, vai despertar em você cheiros, imagens e até promessas de um futuro impossível.

De alguma forma, essa consciência está ali desde o primeiro acorde. Deveria exigir décadas de reflexão, mas a coisa toda é de uma beleza tal que você simplesmente não questiona quando seus dedos e sua voz começam a escolher aqueles caminhos sem volta.

É uma decisão perigosa musicar sentimentos para alguém. Tudo que você é está condensado naquele momento. É pura embriaguez de alma. As represas dos sentimentos desabam, o que flui não molha, apenas devora como o fogo tudo que encontra pela frente. A pessoa amada nunca seria capaz de compreender.

Compor é firmar uma aliança muito mais poderosa do que aquela que se coloca no dedo. A sua própria lembrança se torna discriminatória. Passa a abrigar somente as mulheres melodiosas. Nesse caminho, muitas poderão render boas músicas. No entanto, poucas delas, talvez apenas uma, será dona de uma canção.

O sentimento vai desaparecer, junto com os bons momentos, os risos, os mistérios do corpo outrora idolatrado. Inicialmente, será tudo soterrado pela mágoa. No entanto, de alguma forma tudo isso sobreviverá, mas a partir daí pulsará sem força, fadado a desaparecer no momento errado. Nessa hora, aquela canção vai invadir sua mente. Então você descobrirá o que é a verdadeira tristeza. As melodias nunca vão sumir.

Apenas vão deixar de significar algo para você.

Wednesday, March 21, 2007

Um homem de palavra

Bush está cumprindo sua palavra. Ao custo de 290 bilhões de dólares, o governo devastou completamente o Iraque. A exportação de tâmaras e petróleo, fontes principais de divisas do país, foi reduzida a nada. Graças a isso, o período de ocupação tem sido marcado por constantes crises na indústria petrolífera.

A infra-estrutura do país é mínima. Não há luz e água durante boa parte do dia em quase todo o país. Os gastos militares continuam a aumentar, serão 624 bilhões apenas em 2008.

Outros números também impressionam, cerca de 66 mil iraquianos foram mortos. Entre eles, mulheres, crianças e outros civis que nada têm a ver com a tal Guerra ao Terror. Mais de 3 mil soldados americanos foram mortos no Iraque desde a invasão. Não pense que isso aconteceu na cinematográfica ação militar contra Saddam e seu poderoso exército de desnutridos. Não, 90% dessas mortes ocorreram durante a celebrada redemocratização do país.

Em casa, o Partido Republicano perdeu a maioria. O nível de governabilidade é cada vez menor. Um Tribunal Internacional pretende processar o casal pólvora, Bush e Blair, pelos crimes cometidos no Iraque. O apoio ao governo Bush é o menor desde o início de seu mandato. Os gastos com a manutenção de tropas no Afeganistão e no Iraque já começam a emperrar a locomotiva americana, tornando inviável qualquer confronto em outros fronts.

A paranóia com segurança continua. Tente embarcar pros EUA com uma barba à Los Hermanos. Guantanámo pra você na certa. Bin Laden continua solto, não há nem sinal de seus passos. O anti-americanismo nunca foi tão grande. Manifestações explodem a todo momento, inclusive em território gringo. Os pais americanos temem um novo Vietnã. Motivos não faltam, Bush pretende aumentar o efetivo no Iraque.

No aniversário de quatro anos da invasão ao Iraque, Bush mantém sua palavra. É desmontada aos poucos a maior arma de destruição em massa que já houve: seu próprio país. Congratulations, Mr. Bush!

Friday, March 16, 2007

Metáforas...

O livro sagrado diz que a vinda do anti-Cristo será precedida de acontecimentos cataclísmicos. As trombetas do apocalipse soarão, o dia virará noite, as estrelas sumirão do firmamento, o Flamengo será campeão brasileiro e tudo mais.

Nas últimas semanas, o mundo tem acompanhado uma série de sucessivos fatos que não são propriamente cataclísmicos: Zé Dirceu pede anistia, Alemão é eleito o coitadinho do BBB, Britney Spears ensina o mundo como transformar um sex symbol (contestável, ok) em tribufu de asa em 2 lições, Ilsinho é convocado pra seleção... Aí fica a pergunta: que tipo de desastre acompanharia acontecimentos tão patéticos?

Pinky e Cérebro estiveram reunidos há uma semana em São Paulo para discutirem política internacional. Cérebro não precisa mais conquistar o mundo, ele já preside a principal potêncial bélico-econômica do planeta - o que não o impede de continuar sendo o completo imbecil de sempre. Pinky, mais modesto, aceitou um simpático país de terceiro mundo.

O fato é que velhos amigos se reuniram para conversarem amenidades e nos brindar com as velhas merdas de sempre. A principal delas, partiu de Pinky. Em tempos de preocupações ambientais renovadas e dos sempre atentos olhares para a nossa Floresta Claudiohânica - digo Amazônica - nosso nobre Presidente, ao analisar as posições de Brasil e EuA nessa sacanagem internacional, espalha aos 4 ventos que é preciso que os dois países encontrem o Ponto G da relação para que então possam caminhar em consonância de idéias - ou para o lance rolar gostoso, aprofundando a analogia usada pelo nosso presidente.

O Ponto de Gräfenberg é, teoricamente, uma região do canal vaginal a qual, uma vez atingida e estimulada, conduz a mulher a uma onda de incomensurável prazer. Algo somente comparável (para ela) a uma hipotética situação na qual ela estaria num oasis de grifes internacionais de ponta (Gucci, Versacci, Rauph Loren, Victoria's Secret, Louis Vuitton...), não com ticket ilimitado - porque nós sabemos que seu maior prazer não está no consumo, mas no gasto em si – mas como o prêmio da mega sena disponível para compras.

Analisando somente este trecho, interpretamos que o que Pinky quer é uma relação que seja prazerosa/proveitosa para ambas as partes, não somente um gozo parcial. Uma vez encontrado esse ponto, a harmonia estaria estabelecida. Essa colocação vai do lamentável ao risível e me faz perguntar a mim mesmo quem foi o miserável que tirou o Duda Mendonça do lado do presidente. Nos tempos de briga de galo, ele não falava tanta merda, em analogias tão pueris e descabidas.

Por outro lado novos contornos são evidenciados quando analisamos todo o contexto da mensagem e nos damos conta de que o Ponto G ainda é uma teoria controversa, é algo não cientificamente comprovado e que, portanto, é uma região que pode, inclusive, não existir. Peraí... quer dizer que nosso presidente, com histórico vermelho, passado sindicalista e anti-americano em essência, pode estar aprofundando em vários níveis sua metáfora, apontando para um ponto de concordância que não existe? Estaria ele dizendo em outras palavras que tal harmonia é paradoxal em essência? Estaria ele sustentando seu discurso sobre uma analogia que poucos líderes internacionais alcançariam – o que, evidentemente, não é o caso do limitado George W. Bush?! De quem é esse texto? Quem pensou isso para o nosso presidente?

Porque, vamos combinar, imaginar que ele chegou ao ponto de escrever algo com tamanha profundidade já é querer demais, né não? Bom, meu amigo, aí é mais fácil acreditar na hipótese 1 e chamar o Duda de volta, ou, quem sabe, começar o meu próprio plano de conquistar o mundo.

Wednesday, March 14, 2007

Um sincero apelo

Você pode arrastar sua cabeça por campos inteiros das mais cheirosas rosas do planeta. Lavar o cabelo oito vezes por dia. Usar perfume como gel. Não adianta. Jamais você vai reproduzir em sua cachola o cheiro inexplicável dos cabelos de uma mulher.

Entre outras muitas, essa é uma desvantagem biológica notável. A história humana foi feita graças a essas diferenças. Afinal, para compensar nossa distância desse ser maravilhoso chamado mulher, construímos pontes, exploramos o sistema solar, erguemos arranha-céus e fizemos outras proezas mais. Pensa que todo astronauta não pensa em levar aquela deusa pra um passeio à luz do luar pra contar que lembrou dela ao olhar pra esse lindo planeta azul?

As feministas já devem estar bufando de raiva, dizendo que as mulheres também são capazes de feitos notáveis. Pura verdade. Afinal, aqui não se tenta defender qualquer virtude do macho alfa. Longe disso.

Trata-se de um apelo. Mulheres do mundo, vocês não precisam provar mais nada. Para o bem da humanidade, não dêem cantadas, não bebam até vomitar, não lutem boxe, não joguem futebol e por favor, jamais, nunca, raspem suas cabeças.

Igualdade entre os sexos tudo bem, mas pera lá, estamos falando do cheirinho de cabelos femininos! Um mundo com cantoras como Britney Spears é aceitável. Agora, a Britney careca é o sinal definitivo do final dos tempos para qualquer sociedade de consumo que se preze.

Friday, March 02, 2007

Cegos

Quando a Igreja Evangélica ganha espaço na mídia, geralmente é por causa de algum escândalo. O tom de denúncia domina os noticiários e logo velhos estereótipos são reforçados. É claro que a mídia faz seu papel, apontando líderes religiosos realmente pilantras. No entanto, a maneira como são encarados os evangélicos não só nesses episódios, mas rotineiramente, é bastante curiosa. Para muita gente, parece inexplicável o crescimento desse contingente de fiéis, atualmente na marca dos 24 milhões de pessoas. Burrice, ignorância e fanatismo são características constantemente associadas aos adeptos das denominações evangélicas.

Cresci durante boa parte de minha infância dentro de uma dessas mesmas igrejas entendidas como parte do balaio dos tais crentes fanáticos. No entanto, o tempo passou e devo dizer que poucas vezes nos últimos anos compareci a uma dessas igrejas. Cheguei até a engrossar o coro preconceituoso contra certa parcela dos evangélicos.

Ontem, atendendo um convite sempre recorrente de minha avó, evangélica a quem muito admiro, decidi fazer uma visita à sua congregação, a Assembléia de Deus. Porém, dessa vez, entrei lá despido de preconceitos.

O lugar era simples, um pequeno salão abrigava os cerca de vinte alegres fiéis. Já na entrada, fui saudado com entusiasmo por pessoas que jamais havia visto na vida. Conversavam comigo com sinceridade no olhar, enaltecendo minha presença. Foi inevitável não me sentir acolhido e entre amigos.

Iniciado o culto, a esposa do pastor comandou com vigor a cantoria, composta por timbres roucos, agudos e graves, em sua maioria bastante desafinados. Isso não pareceu importante naquele momento, todos cantavam a plenos pulmões, como se aquela fosse a grande ópera de suas vidas. Não havia qualquer instrumento musical para acompanhá-los, as notas vinham diretamente do coração de cada um dos fiéis.

Em outro momento, duas meninas foram à frente para fazer um dueto. Para minha surpresa, cantaram muito bem, com uma emoção que muitas divas do pop apenas ensaiam ter.

È grosseiro o que vou escrever, mas é importante citar certos detalhes. Uma das meninas cantoras devia ter uns 16 anos, era bastante gorda, com roupas bem antiquadas e um problema de pele bem evidente, que causava manchas brancas que se espalhavam claramente por boa parte de sua pele. Qualquer adolescente que eu conheço não sairia de casa em tais condições.

Nada disso era importante. A cada agudo certeiro da menina, ficava evidente a empolgação de todos, demonstrada também com muitos aplausos ao final de cada uma das três músicas apresentadas. E ela sorria, cantava, agradecia pela chance de estar ali à frente, completamente exposta a um estranho como eu.

Essa apresentação vigorosa contrastou com a seguinte. Uma mulher, de olhar sempre baixo, pediu oportunidade para cantar. Sua voz era fraca e tinha dificuldade para manter a entonação da música. Na platéia nada mudou, o entusiasmo era o mesmo. A mulher deixou o palco improvisado sob aplausos calorosos, com um sorriso que se esforçou para ocultar.

Verdadeiros brados de vitória eram dados, as pessoas sorriam e batiam palmas. Logo depois, a esposa do pastor cedeu a palavra a uma senhora humilde. Ela começou a ler um pequeno trecho da Bíblia. Confesso que não lembro bem qual, não só por minha memória ruim, mas pela leitura truncada e cheia de erros, típica de pessoas com falhas de alfabetização. Quando ela terminou, nova surpresa, todos aplaudiam, inclusive eu.

O momento mais esperado da noite enfim chegava. O pastor se dirigiu à frente com um largo sorriso e Bíblia na mão. Com paixão, falou sobre a cura de um homem visto pela sociedade como alguém inferior, insignificante. Ninguém deixava aquele homem chegar perto de Cristo. Ele conseguiu sua cura literalmente no grito, abrindo espaço entre a multidão. Esse homem queria ver, era cego.

Não me deparei com ninguém cego naquele culto. Mesmo assim, acontecia ali um milagre de proporções bíblicas, se considerarmos os dias em que vivemos. Aquelas pessoas queriam algo mais importante do que ver, elas queriam ser vistas.

Isso tudo não explica apenas o sucesso de tantas denominações evangélicas. Explica também o fracasso de um mundo que debocha de algo mais sagrado do que a igreja, pastores, padres ou estátuas. O ser humano.

Thursday, February 15, 2007

Confissão

Ok, ok, OK!!! Amigos de várias décadas, anos, meses, amigos muito próximos, distantes, ou mesmo colegas. Amigos da escola, faculdade, da rua ou do trabalho, amigos em contatos e aqueles que estão somente na memória, a todos eu tenho uma confissão. Agora, depois de 28 anos de existência estou preparado para admitir que tenho um grande defeito: eu não bebo!

A todos os que não me conhecem vale a explicação: a confissão não está no fato de eu não beber. Isso sempre foi público, notório e, de certa forma, dito e redito de forma orgulhosa perante àqueles que sempre sonharam em me ver de pileque - e são tantos... A confissão, como você, se for inteligente, já deve ter notado, está no fato de hoje eu ver isso como um defeito.

A verdade é que essa condição, que já dura quase 3 décadas, me tornou mais "careta" do que meu próprio pai - um inspetor de polícia, com quase 30 anos de serviços prestados à sociedade e à Ambev. Não foi uma nem duas vezes que eu o vi coçar a testa e balançar a cabeça em reprovação, ao me ver negar uma latinha, quando ele esvaziava mais uma junto com os meus camaradas. Enquanto isso eu ficava nos inocentes goles de refrigerante.

Essa vida de abstemia, me rende momentos inenarráveis que só a observação sóbria, em meio aos excessos dos bêbados do meu coração, me permite registrar com devida clareza, faz de mim um porto seguro a todas as horas e tal. O problema é quando essa minha pouca vocação ao álcool começa a afetar a minha credibilidade.

Seja honesto: agora que você descobriu que eu não bebo, meu texto perdeu 90% da sua contundência, não perdeu? Tornei-me um sujeito inofensivo e de contestações regadas a Nescau, um verdadeiro George Mcfly (para quem não lembra, assista De Volta para o Futuro). Eu, por exemplo, jamais dividiria uma mesa em Ipanema com Tarso de Castro, Roniquito de Chevalier, Mielle, Mário de Almeida, Jaguar, e demais figuras dos melhores debates úteis e inúteis que a zona sul do Rio de Janeiro já produziu. Jamais seria convidado para escrever no saudoso O Pasquim, em seus tempos de glória - e daí que eu sou publicitário? Por acaso você acha que Tarso de Castro fez faculdade de jornalismo, seu merda?

Minha abstemia me afasta desse time e me coloca em paridade com os inofensivos formadores de opinião destes tempos de merda que vivemos hoje: os engomados e insôssos William Bonner, Hélter Duarte e o mané que parece o Tom Cavalcanti e que comanda o Jornal Hoje, cuja mínima expressividade me impede de sequer lembrar seu nome. Um bando de manés com a latinha nas mãos e que não fazem absolutamente nada com o poder que têm, nessas baboseiras de jornalismo imparcial e pluralista. Alguém ainda acredita nessas de serviço à comunidade, partindo da tal "isenção"? ONDE ESTÁ A OPINIÃO?!

Bom... vou terminar de beber a minha Heineken e pensar no que ainda pode ser feito.

A conspiração de Popeye

As crianças pré-Youtube, entre as quais me incluo, também tinham certo poder de escolha. Podíamos montar nossos playlists a partir de um time poderoso de desenhos animados, distribuídos em três ou quatro canais. Gostava muito e ainda gosto do Perna-Longa, sempre tirando todo mundo pra louco, do Pica-Pau, baita debochado, e da Caverna do Dragão, apesar de me irritar aquele unicórnio-jumento, sempre fazendo alguma cagada que atrasava a turma justamente quando todos estavam prestes a fugir daquele mundo bizarro.

No entanto, outras atrações passavam batidas. Não me convencia nenhum exemplar da trupe criada por Hanna-Barbera (que, admito, só há pouco descobri se tratar de uma dupla e não de uma tia sem talento pra coisa). Mas detestava mesmo era o Popeye. Uma mulher mala, esquisita, mal-vestida e magricela era o motivo para que Brutus e o Popeye vivessem se esmurrando. Não que eu tivesse um senso de beleza muito desenvolvido. No entanto, eu via na telinha Xuxa, Mara-Maravilha e Angélica. E Olívia Palito, meus amigos, estava muito longe, esteticamente falando, daquelas musas-mirins voluptuosas (que, aliás, eram tão malas quanto a tripa seca).

Popeye começou em 1933 e é exibido até hoje. Nesse meio tempo, o padrão estético mudou um bocado. Na verdade, emagreceu muito. As modelos esqueléticas, sem cérebro, com caras esquisitas e, pasmem, roupas estranhas, passaram a ser o objeto de desejo e fascínio de homens e mulheres do mundo inteiro. Uma geração nascida justamente no fatídico período de exibição das aventuras do marinheiro.

Percebeu a conspiração? Popeye foi a arma elementar da indústria da moda para nos convencer a idolatrar mulheres como Olívia Palito! Ao invés de comer feito bicho o tal espinafre miraculoso, Popeye deveria alimentar aquela desnutrida. Você já viu Olívia Palito encher a barriga em algum episódio? Pois é, está aí, Popeye e Brutus se matavam por causa de uma anoréxica.

Eis o poder de uma simples animação na formação dessa linda sociedade neoliberal. Agora imagina o que algo como Rebeldes fará à nossa civilização nas próximas décadas... Pensando bem, Popeye não é tão ruim assim.

Wednesday, February 14, 2007

A peça que nunca termina

A cronologia de uma tragédia no Brasil é ofensivamente previsível. Em um dia qualquer, os parâmetros do grotesco e da desumanidade, já absurdos no país, são ultrapassados. A barbárie contra um inocente como João Hélio desperta o clamor generalizado por justiça ou até mesmo por vingança. A polícia trabalha de verdade e caça todos os culpados. A caminho da cadeia, os bandidos são hostilizados, em cena devidamente filmada pelos grandes canais de televisão. Autoridades declaram que medidas enérgicas serão tomadas. Os parentes da vítima estão no Jornal Nacional. Em pouco tempo, chegam a Brasília pedindo soluções. O roteiro chega ao seu ápice: políticos compenetrados apertam mãos selando pacotaços e outros remendos à lei.

As novas medidas são comemoradas como vitória da democracia. A população e algumas celebridades globais vestem branco, saindo às ruas. A mídia apóia com alta dose de emotividade e sensacionalismo, celebrando os esforços pela paz. Alguns meses depois, a polícia ou até os próprios presidiários matam na cadeia alguns dos bandidos. Os pacotaços e as leis caem no esquecimento, sem sequer terem sido aplicados uma única vez.

Mesmo em casos como esse, de repercussão pública, esse ciclo de violência e morte é apresentado como algo breve. Não acredite nisso. Este ciclo nunca acaba porque é mais do que um ciclo. Não tem início ou final. É uma peça trágica, encenada todos os dias, todas as horas, todos os minutos. Nessa tragédia se repetem os mesmos personagens, as mesmas vítimas, os mesmos culpados e as mesmas falhas de script. Infelizmente, apenas o cenário muda sem parar. O cenário é o Brasil do passado. É o Brasil do presente. É, cada vez mais, o Brasil do futuro.

Friday, February 09, 2007

Trote

Eles estão na vanguarda da moda. Eles dirigem carros possantes e equipados. Eles serão os primeiros a comprar o Iphone. Eles estão nas festas mais badaladas. Eles provam as mais novas e potentes drogas sintéticas. O mundo é desenhado para eles e eles pincelam esse mesmo mundo. Eles marcam seu ingresso na vida adulta com grande estilo. Na universidade, a grandeza vindoura de suas vidas é demonstrada logo de cara, no trote. Por isso, não poderiam ser apenas brincadeirinhas bobas. Até parece. Não...eles têm estilo, fazem do trote um evento memorável.

Na última segunda-feira, em São Paulo, na Unicid (Universidade Cidade de São Paulo), sua criatividade mostrou toda a força. Vinte e oito calouros foram amarrados uns aos outros e obrigados a caminhar até a estação de metrô ouvindo insultos e sofrendo agressões. Genial, não? Impressionante que os veteranos, nem mesmo formados ainda, tenham conseguido realizar algo tão inteligente.

Quando todos pensaram que não haveria como tornar melhor a festa, uma idéia surge. Eles começam a cortar as roupas das meninas do grupo de calouros. Uma delas fica completamente nua. Ela tem 17 anos, chora, ouve xingamentos, é chamada de prostituta pela horda de excêntricos intelectuais. Implora para que parem, grita por ajuda, clama por seus pais. Não adianta, ninguém ouve. Apenas gritam, comemoram, riem.

Cretinos da pior espécie? Não. Cidadãos do futuro. Médicos, advogados, arquitetos. Os mesmos que um dia terão filhos como a adolescente que teve as roupas arrancadas. Os mesmos a quem não será dado o direito de derramar uma lágrima sequer ao consolar a filha que foi destruída no momento de maior alegria de sua vida.

Thursday, February 01, 2007

A pergunta

Há cerca de dois anos, realizei meu sonho de vida: conhecer a Patria Guia, Cuba. Mas hoje eu tenho uma pergunta.

Me tornei comunista ainda na pré-adolescência e já na quinta série era capaz de lecionar sobre a história da China e de Cuba, falar dos discursos de Marx e Lênin com maior propriedade que meus professores. Tinha sempre uma camisa vermelha por debaixo do uniforme do colégio e uma foto de Guevara em todos os cadernos. As épocas de maior excitação não eram exatamente os tempos de olimpíadas escolares, mas a época de militância e das passeatas Fora Collor por todo o Rio de Janeiro. Agora, a pergunta não me sai da cabeça.

Evidentemente, é de se imaginar que eu não era o tipo mais popular na escola. Minha aparência franzina e de ombros pesados, meus óculos e minha inseparável boina, com foto de Guevara bordada eram motivos de aversão e piadas. Enquando meus contemporâneos, cultuavam idolatria à ícones vazios, como Axl Rose e cia, eu seguia meus líderes vivos: Fidel Castro e Leonel de Moura Brizola - o maior estadista que este país já conheceu. Meu "colegas" me sacaneavam, escondiam meus óculos, e jogavam cocô em mim. Apesar de não ser negro, meu apelido na escola era Miréia. No fundo, devo confessar que gostava do apelido, porque a gazela negra das quadras internacionais de vôlei era também um símbolo do sucesso e do heroísmo da Pátria Guia, Cuba, contra os porcos Yankees. Mas o problema é a pergunta.

Meu maior desejo era que aquele tempo acabasse e eu fosse para a faculdade, onde poderia me filiar à juventude universitária do PCdoB e conviver com pessoas sem preconceitos, mas com muitas idéias e vontade de fazer a diferença. Estar ao lado de pessoas que assistiam Anos Rebeldes toda semana, passavam o dia inteiro ouvindo Andança e fediam a suvaco podre como eu. Só com muito suor se salva este país. Mas nesse instante, só o que me resta é a pergunta.

Vibrei com a resistência da Pátria Guia, Cuba, ao veto internacional e com a sustentação com que esse povo e seu paladino mostraram a todo o mundo que sim, era possível. Tinha sonhos recorrentes com o líder Fidel surgindo das águas, pegando o dedo do Tio Sam e enfiando-lhe rabo adentro. Era lindo! No entanto, a pergunta martela, sem resposta em minha cabeça.

Então realizei meu grande sonho. Fui a Cuba e fiz a minha leitura daquela realidade. O tal do mercado da prostituição, tão criticado pela pestilenta Rede Globo, nada mais é do que uma demonstração de que aquilo é produto para consumo estrangeiro, ou seja, uma falha no embargo - porcos capitalistas. A medicina, uma das mais avançadas do mundo, só não dá acesso a todos porque a tecnologia é coisa do capeta e impede que o homem se esforçe em busca do êxito. Quem dera nossos médicos fossem tão bons quanto os cubanos. Quem me dera, eles me respondessem à minha pergunta.

Que lugar! Que gente! Um povo guerreiro, que padece para mostrar ao mundo que é o sofrimento que torna valoroso o homem. Um povo apegado às suas raízes que se sacrifica pela sua dignidade e se submete à escassez de recursos pela sua honra. Todos pelo grande líder! Todos pela pátria! Assim, é claro, todos os fracos e desertores merecem mesmo o exílio e o esquecimento. Que deixem seu povo e vão viver vidas rasas, mesquinhas e sem significado em um país qualquer, que não os reconhecerão como seus. Façam o que quiserem, mas, pelo amor de Deus, me respondam à pergunta:

Fidel, se tudo é assim mesmo, por que diabos você foi tratar da sua ziquizira em Madri, seu velho filho da puta?! Tu tá caduco ou tá de sacanagem?!

Tuesday, January 30, 2007

Sobre rafting e mantras

De vez em quando decido me sentir vivo. Então, ao invés de fazer algo de relevante na vida e assim conquistar algum orgulho próprio, decido fazer algo mais prático e mais fácil de ser utilizado como troféu em algum papo, a fim de ocultar minha mediocridade. Para isso, a cada passagem do cometa Halley, invento alguma atividade perigosamente inofensiva para impressionar ouvintes mais desatentos. No último ano, escolhi o rafting. Para tornar ainda mais notável a façanha, decidi que a realizaria no Rio das Antas, trajeto reconhecidamente tortuoso.

Olha, a coisa toda não era tão fácil assim. Mesmo em época de relativo baixo nível das águas, o bote parecia indomável. A cada pequena cascata o frio na barriga vinha e com ele a dificuldade em posar de garotão Ecosport. No entanto, o colete, o capacete e a presença do guia tornavam a aventura um mergulho em uma Jacuzzi. A bagunça podia ser grande, mas ninguém sentia medo pela própria segurança de verdade.

Nem mesmo nas três vezes em que o bote virou e todos foram jogados no rio, houve pânico. Na verdade, a turma até ria da situação. De perigoso mesmo nessa história, só alguns trechos de estrada ruim. Também devo admitir que, no momento das instruções dos guias, a expressão séria dos caras metia um certo medo. Exagero de minha parte, pensei na época. Tudo tinha sido muito tranqüilo e voltei com um pouco mais de bagagem egocêntrica e várias fotos do trajeto, prontamente oferecidas a módicas quantias pela equipe organizadora do passeio.

Nem lembrava mais disso tudo quando abro o jornal e vejo a notícia sobre a menina morta neste final de semana no mesmo tipo de passeio, mesmo rio e mesma equipe organizadora. Vejo ainda que ela era uma aventureira nata, acostumada não só ao rafting, mas também a diversas outras modalidades com igual ou maior carga de perigo. Como cenário para essas incursões, ela escolhia locais com natureza exuberante e, de preferência, nativa. Michele, uma guria de 26 anos, era muito querida por todos, praticava dança do ventre e adorava cozinhar pros amigos. O namorado ficou inconsolável, do jeito que ficam os caras que perdem pra sempre uma das poucas meninas por aí que você tem a certeza de chamar de minha menina até segurar pela última vez sua mão, mesmo que seja esta uma mão cheia de rugas. Michele cursava Direito em universidade federal e deveria se formar ano que vem. Amigos e colegas já encheram de mensagens carinhosas sua página no Orkut.

Nestes momentos, sou obrigado a acreditar em frases de efeito como “os bons morrem cedo” ou “a vida não é justa”. Me incomoda que eu comece a utilizar esses mantras de Diário Gaúcho pra entender não apenas a partida de pessoas decentes, mas também para justificar minha própria permanência nessas bandas.

Wednesday, January 24, 2007

Gringas pela paz

Jamais subestimem o potencial turístico da Cidade Maravilhosa. Mais um dos símbolos do Rio alcança status de roteiro turístico obrigatório, ao lado de ícones como Cristo Redentor, Calçadão de Ipanema e Projac. Até hoje ninguém havia percebido o potencial de uma das marcas da cidade: a sua força policial, amostra poderosa da alma carioca e das mais fortes emoções vividas na cidade.

Nada é maior do que a glória em sentir-se como um combatente da Polícia Militar carioca ou como um mané qualquer sendo algemado e levado para tomar uns croques na delegacia. Essa emoção toda está escancarada nas fotos das três turistas estrangeiras que decidiram mostrar ao mundo o que só o Rio e algumas poucas republiquetas subdesenvolvidas têm.

As fotografias merecem uma breve descrição. Em uma delas, o policial posa ao lado da viatura, tendo ao seu lado uma sorridente turista. O fuzil nas mãos da gringa completa o cartão postal no maior estilo reality show. Em outro retrato, a alegria não pode ser contida nem pelas algemas, adrenalina total!

Mais surpreendente ainda é a cara dos policiais. Sem qualquer constrangimento, os solícitos oficiais mandam ver nas poses, estufando o peito e até abrem um sorriso em alguns casos. Nada disso seria um escândalo se não estivéssemos falando sobre uma das forças policiais mais violentas e corruptas do mundo. Talvez o pessoal retratado nas fotos até faça parte da pequena fração de policiais ainda honestos. De qualquer maneira, as alegres turistas não teriam como fazer essa distinção.

Talvez as estatísticas e os jornalistas estejam equivocados. Talvez os policiais sejam realmente bonzinhos como esses, talvez a gente tenha exagerado em temer tanto os homens da lei. É só ver as fotos. São boa gente, amigos do povo. No mesmo raciocínio, quem sabe até os criminosos não estejam carregando um estigma pesado demais. As ilustres estrangeiras estão aí pra demonstrar o poder de um voto de confiança. Despertar largos sorrisos e brincar com as armas dos policiais podem ter sido apenas os atos iniciais de uma mudança sem precedente nesse, até hoje, tão conturbado relacionamento entre civis, autoridades e criminosos.

O escândalo ofuscou uma idéia brilhante. Se as gringas deslumbraram de tal forma os policiais, ganhando de barbada suas armas, imagina o que não fariam entre os bandidos. Campanha de desarmamento? Que nada. Mandem meia dúzia de suecas peitudas com camiseta molhada para cada morro e está feita a pacificação de nosso bizarro país.

Friday, January 19, 2007

Eu odeio o Cavalinho - gratuito (mas nem tanto)

Antes que você comece a me recriminar e me chamar de porco, enquanto digita a sua denúncia no formulário do Ibama Online, é preciso que você saiba que não tenho absolutamente nada contra eqüinos em geral - pelo menos não contra aqueles que você está pensando.

Cavalinho é uma versão com mais idade do bom e velho "playboy de merda" com quem você provavelmente conviveu durante boa parte da sua fase escolar. Em linhas gerais, o playboy, é um sujeito cuja personalidade mantém relação de proporcionalidade direta com o tamanho do próprio pênis. Praticamente um eunuco, o playboy se comporta rigidamente segundo a aceitação do seu grupo referência, o que acaba por limitar sua liberdade de expressão a meia dúzia de convenções assumidas e reproduzidas por toda a comunidade. Até por aí, torna-se nítido o fato dessa ser uma espécie que se reune em bandos e, em função da padronziação de comportamento, é exatamente o bando como um todo que apresenta a exata manifestação da (pouca) personalidade de cada um.

Assim, o teorema do matemáchico Jesse Valadão postula o seguinte: considerando que o comportamento do bando manifesta o somatório das frações de personalidade igualmente divididas entre seus membros e que essa manifestação é necessariamente uma unidade peniana, temos que "o número de zé manés do bando multiplicado pelo coeficiente de personalidade do grupo é igual a uma (e não mais do que uma) piroca de tamanho médio, ou: Z . C = 1.

A partir daí, muitos mitos podem ser quebrados. Por exemplo, muita gente acha que não existe relação lógica entre o tamanho do pênis e certos comportamentos masculinos no trânsito e reproduz a ofensa como puro chiste. Não se trata de uma ofesa vazia, mas fruto de um estudo comportamental de uma determinada sub-categoria de seres humanos, comprovada matematicamente pelo Teorema de Valadão. Pode crer que dentro daquele Audi A3 tem um playboy ouvindo surf music e ajeitando a franja no retrovisor.

O Cavalinho é o playboy que ultrapassou os 25 anos sociais. Não estamos falando de idade cronológica (mais prática) nem de idade mental (porque também já seria exigir demais). Estamos falando de uma idade em que as convenções sociais mudam, ele se vê obrigado a conviver com gente normal, então precisa de todo um trabalho para se adaptar aos novos ambientes e exigências dos variados grupos - o que é difícil para um sujeito com intelecto de ameba e ainda deteriorado pela parafina. O primeiro e único passo normalmente é trocar as camisas da Billabong e por camisas Pólo (daí a referência ao Cavalinho), o segundo é deixar de usar óculos da Osklen e adotar as lentes verdes Ray-Ban e o terceiro passo não tem. Acabou. Atingimos o total amadurecimento de um playboy, e se completa a sua transição para um Cavalinho.

Sua nova condição complica e limita as vergonhosas manifestações de sua personalidade coletiva a momentos selecionados. Assim, o Cavalinho é um sujeito que, quando não está no seu clube de cricket ou reunido entre amigos na festa de Laurinha, filha dos Carvalho de Albuquerque que acabou de voltar de Genebra, é um sujeito em constante conflito em busca da resposta de como se portar diante de gente. Até por isso, vivem fazendo merda, sendo expostos desnecessariamente e tendo problemas até pra comer mulher.

Agora, apesar de estar concordando com cada uma das minhas palavras, você me pergunta: por que você está escrevendo tudo isso?! Onde você quer chegar?

Eu não quero chegar a lugar nenhum. Eu só quero ofender. Esse é o post que eu gostaria de ter escrito na semana passada, quando o coito interrompido e a falta de tato (sic) do merda do comedor de Cicarelli tirou o Youtube do ar, mas, assim como ele, eu não consegui chegar até o final.

Agora, missão cumprida e vida que segue. Viva o Youtube.

Se você é solidário à minha aversão por essa sub-espécie e quer falar a respeito, acesse e junte-se à comunidade Eu Odeio o Cavalinho, no Orkut.

Tuesday, January 16, 2007

Retratos

Churrasco em família, aniversário de algum parente. A pauta de assuntos familiares é cumprida até as últimas gotas. Após os serviços, impera um silêncio inevitável, logo interrompido por meu tio roncando, atirado no sofá. Minha tia joga oito quilos de fotografias na mesa. Sessão nostalgia.

Incrível como as roupas definem tão bem aqueles momentos já jurássicos. Você liga a TV hoje e pensa que os caras exageram na caracterização de determinadas décadas. Que nada. Eles até aliviam.

Entre as 5968 fotos, nem seria preciso olhar o verso do papel (no século XVIII, no auge dos filmes, a data era impressa ali) pra sacar a passagem do tempo. Os sinais estavam todos lá, em momentos de uma alegria quase ofensiva, de tão ingênua. As costeletas marcavam a passagem de Elvis. Os terninhos apertados emulavam Beatles em seu auge, na década de 60. Roupas floridas evidenciavam o tom dos hippies anos 70. Ombreiras se destacavam como um dos muitos símbolos do glamour-pavão oitentista.

Talvez aquele povo, aparentemente tão atento à moda, nem soubesse bem porque se vestia daquela forma. No entanto, eles observavam, eles faziam parte de um mundo, nem que fosse como um simples espelho dele. Os últimos resquícios fotográficos familiares param na década de 90. Ali começam retratos um tanto sem graça, nenhuma combinação esdrúxula de cores, nenhum penteado que faça crianças chorarem, nada de acessórios carnavalescos.

Aqueles meus tios e tias, meus pais, avós, primos, não se vestem mais daquela forma. Não falo de calças boca-de-sino, calças de couro ou tênis kichute. Eles não vestem mais o espírito de sua época. Nem dessa (se é que existe), nem das que passaram.

Nesse meio tempo, a câmera digital surgiu. A sessão nostalgia ameaça migrar para o reino digital. Será uma pena. A possibilidade de escolher apenas o que se quer guardar anula o poder daqueles momentos tão preciosos, também chamados de vida.

Thursday, January 11, 2007

O outro lado da história

Um belo dia, lhe contaram a piada da Sharon Stone na ilha deserta. Aquilo o fez rir como poucas vezes na vida. Era bem aquilo mesmo: o cara tinha que contar para alguém! HAHAHAHAH! Mas também, quem não contaria!? É a Sharon Stone, porra!!

A história ficou em sua cabeça por muito tempo e ele reproduzia a história em todo canto que ia. Ninguém mais o aguentava e a coisa virou uma espécie de obsessão, um objetivo de vida. Ele tinha que comer uma celebridade e tirar vantagem disso.

Descolado, endinheirado, boa pinta e bem relacionado, fez algumas ligações e naquela mesma noite seu ap estava cheio de camaradas e celebridades femininas. Loiras, morenas, negras, ruivas, siliconadas, saradas, atiradas, recatadas, todas presentes na sua festa. Mas lá estava ela, deslumbrante, encantadora. Era experiente, reconhecida no exterior e a encantadora forma como se portava entre seus convidados, espontânea e à vontade, deixava claro que ela não teria certas frescuras. Não demorou, estavam namorando.

Semanas depois ele pôde concretizar seu plano. Tirou a desinibida do país e se mandou para uma dessas praias européias "prafrentex". Mas uma coisa ainda o incomodava: todo mundo já sabe que estou pegando, o que eu posso fazer para causar impacto? A resposta veio na própria praia. Lá estava um jovem rapaz de seus 30 anos, registrando seu final de semana em família. Ele não exitou e ofereceu uma grana pro cara registrar todas as suas peripécias a dois. E que peripécias! Pagou adiantado, com uma única ressalva: seja discreto, porque ela não pode perceber. Afastaram-se do povo e começaram o show. Mão aqui, dedinho nervoso ali, muito roça-roça, glu-glus, piu-pius, barracas, faroletes e dali direto pra água, quando começaram ela, de fato, começou sua prova particular de equitação artística.

Está certo que nos parcos minutos em que a cabrita cavalgou no pangaré, o esforço era muito mais no sentido de se ajeitar numa coreografia minimamente harmônica, do que propriamente para sentir o momento, mas eles pareciam se divertir. Até que ela vê a filmadora. O mané não conseguiu ser discreto e ela largou a montaria. Atordoado e ainda com seu pequeno instrumento inquieto, nosso herói não teve forças nem para convencê-la a terminar o serviço e saiu da água com um chumaço de algas protegendo sua intimidade, que, ainda em riste, como que se esforçando para olhar pra cara de seu dono, parecia indignada perguntar: "Mas ué?! Acabou?!"

O câmera fugiu com a grana e seu conteúdo e o vídeo foi parar na Internet. Todo mundo viu o que ele fez com a sua celebridade, mas não estava nos seus planos ter ficado reconhecido por aquele abandono. A vergonha e a ira queimavam em suas veias e desde então ele não consegue relaxar seu pênis. Ele jurou que alguém pagaria por isso. E ele tinha razão.

Mas porra, Tato, me deixar sem Youtube por causa de um coito interrompido é sacanagem!!!!!

Tuesday, January 09, 2007

Segundos

Foi há dias atrás. Era um momento raro, no qual se tornou evidente a urgência de passar para o papel algo importante demais para ser deixado no computador. Estava indo buscar folhas para alimentar a impressora (não sei como ela não morreu de inanição ainda) e então veio aquele lampejo imbecil.

Provaria ao meu intelecto cínico e moldado pelo modo de vida capitalista a capacidade de preservar ainda algumas trincheiras. Construiria a obra máxima da engenharia aeronáutica infantil. Antes de iniciar os trabalhos, a confiança era total, nem sequer um segundo de hesitação seria registrado. Meros quinze anos não poderiam apagar a certeza e a habilidade praticamente tatuadas nas profundezas da minha alma, tão densas como o intelecto de um ex-BBB.

O momento da primeira dobra no papel ainda estava encardido pela auto-confiança, e, por alguns momentos, a situação continuou assim, até ser seriamente abalada pela segunda manobra. A terceira tornaria inviável toda a sustentabilidade do projeto, tornando obrigatória a reconstrução do modelo. As cerca de quatro tentativas posteriores revelaram minha total inaptidão em elaborar um avião de papel que permanecesse no ar por aqueles poucos e infinitos segundos.

A frustração era inédita, os aparatos da vida moderna não preparam o ser humano para algo assim. Claro que bastaria abrir o Google e resolver tudo sem muita queima de neurônios. Sem muito esforço, poderia até ter encontrado informações na internet sobre modelos com as mais bizarras matérias-primas, de árvores de reflorestamento a rolos de papel higiênico. Até simulação do 11 de setembro em versão celulose já deve estar rolando no Youtube..

A coisa toda era um pouco mais complicada. Mais do que resgatar as habilidades infantis na construção aeronáutica, precisaria buscar algo mais importante: talvez criatividade, inocência ou, sei lá, um psiquiatra. Uma coisa era certa: teria que pensar por mim mesmo.

Fora de cogitação. Hoje em dia, não ter alguém te dizendo o que fazer o tempo todo é perder o norte do caminho rumo à Ilha de Caras. Como eu manteria meu tão descolado estilo de vida? Que chances eu teria no próximo Big Brother?

Preferi transformar o promissor projeto em uma bola de papel e arremessá-la longe com certa raiva e uma melancolia bem específica. Aposto que voou mais tempo do que voaria o maldito aviãozinho. Mesmo assim, foram poucos segundos, mas dessa vez, nem um pouco eternos. Saudades da infância.

Thursday, January 04, 2007

Sonhar não custa nada

Dormir bem é bom pra cacete. A questão toda não está nem relacionada a acordar tarde, a dormir muito, nada disso. É, simplesmente, dormir bem. A coisa toda está relacionada à qualidade da cama e travesseiros, do ambiente do sono, posição do corpo e tudo mais.

No meu caso, o principal fator que condiciona um bom sono é a não obrigação de ter um horário para acordar. A tendência, inclusive, é de que eu acorde num horário muito próximo daquele em que todos os dias essa merda de V220 da Motorola me tira da cama. A questão é poder ficar rolando na cama até que eu decida o momento do "agora vai". É assim que prega a natureza.

A escravidão moderna substituiu a violência das chibatas pela agressão dos relógios - entenda relógio subjetivamente como compromissos e horários, ou mesmo da forma mais prática e irritante dos despertadores, que, se bobear, hoje podem ser encontrados até na obturação do seu molar. Tenho verdadeira aversão à coitada da Joss Stone - de cujas canções já gostei um dia - pelo simples fato de que, graças ao meu celular, os primeiros acordes de Super Dooper Love pra mim significam "Acorda, filho da puta". Não é de se espantar que o estresse seja um dos principais males da humanidade nos tempos contemporâneos.

Um bom sono é fundamental para a saúde física e mental. A ele estão diretamente ligados os conceitos de qualidade de vida, bem estar e até de produtividade. Além disso é um dos principais remédios da natureza para os ambientes e épocas hostis. Imagina que inferno não seriam as florestas carregadas de ursos carrancudos, rabugentos e cheios de merda num inverno desgracento! Imagina a carnificina e a quantidade de animaizinhos da Disney estraçalhados num dia ruim de um grupo de ursos entediados! Acostumados com o verão - época da abundância e da vida, dos alimentos fartos e saborosos, quando se alimentam e se reproduzem – e sem terem um Playstation 2 por perto, os ursos hibernam por toda a estação fria, justo quando tudo o que precisam para fazer com que suas vidas valham a pena está escasso. Não se incomodam e não perturbam ninguém. Feito isso, acordam na primavera prontos para outras, com um espírito mais aberto, animado, feliz, vivo, tolerante, positivo e disposto.

Diante disso, fica uma pergunta para você, meu caro Arquiteto: por que raios você ainda não utilizou essa brilhante idéia, que deu tão certo com os ursos, para as mulheres e seus ciclos de 28 dias? Fica inclusive a sugestão para quando você resolver dar um novo reload na Matrix. Essa conversa de TPM é dose pra Zé Colméia, porra!